A saúde não pode esperar

Sidnei Ferreira

Há filas de espera de mais de 13 mil pacientes para cirurgias, dois mil deles, crianças. Há emergências apinhadas com doentes — muitos em estado grave

As notícias de repercussão nos últimos meses deixam uma certeza: a administração pública tem pressa para deixar a cidade pronta para os eventos (agora é a vez das Olimpíadas 2016), para construir estádios, viadutos, melhorar a mobilidade urbana e a segurança. Há pressa em consolidar o Rio de Janeiro como um dos principais destinos turísticos internacionais. Tudo isso é, sem dúvida, importante para o país e para a população. Os avanços sociais e econômicos são inquestionáveis. Mas um setor primordial parece ser relegado a um segundo plano por aqueles que têm a maior responsabilidade, as autoridades. A saúde é cada vez mais deixada de lado. Os investimentos, tão reivindicados por nós e essenciais para o setor, são encarados como dispensáveis.

Enfrentando, há tempos, uma série de dificuldades, a saúde aguarda sua vez, mas a verdade é que não pode esperar. As constantes fiscalizações do Conselho Regional de Medicina do Estado do Rio de Janeiro nos hospitais, clínicas e postos de saúde do estado comprovam a carência do setor e alertam para a urgência do tratamento. Há filas de espera de mais de 13 mil pacientes para cirurgias, dois mil deles, crianças. Há emergências apinhadas com doentes — muitos em estado grave — pelos corredores esperando horas por atendimento. Há um déficit diário de mais de uma centena de leitos de UTI. Serviços e hospitais estão sendo fechados por falta de recursos e infraestrutura. Os médicos enfrentam péssimas condições de trabalho, salários incompatíveis, vínculos trabalhistas precários. O que encontramos são equipes inteiras desfalcadas, cansadas, desmotivadas.

A situação é grave ainda por outros motivos. A preceptoria está prejudicada e a transição entre os profissionais experientes e os recém-formados não tem sido feita com o devido cuidado. Assim, novas equipes e serviços não se formam da maneira adequada para garantir um atendimento digno à população.

No momento, a “(des)culpa” são as eleições. Quando o Cremerj cobra as soluções da administração pública, a resposta é sempre a mesma: os prazos eleitorais. “Só podemos pensar nisso em janeiro de 2015” é o que ouvimos repetidas vezes. Já fomos incontáveis vezes ao Ministério Público denunciar os desmandos e o descaso e propor ações que levem o poder público a agir e permitam à saúde sair a tempo da UTI e ser capaz de atender com profissionalismo, eficiência, infraestrutura e remédios os que mais precisam: a população em geral e a do Rio de Janeiro, em particular.

Os prazos acabaram, a situação é de emergência. A saúde não pode esperar! Mortes e sequelas evitáveis estão acontecendo a cada minuto. Pacientes com câncer e outras doenças graves estão perdendo a chance de cura e tratamento. Os programas para controlar o caos nas unidades não funcionam. A prevenção e a promoção da saúde transformaram-se em devaneio. Enquanto pessoas morrem nas filas de espera de hospitais, pergunto: quem será responsabilizado por mais quatro anos de iniquidade com a população?

Artigo escrito por Sidnei Ferreira, presidente do Conselho Regional de Medicina do Rio de Janeiro (CREMERJ) e publicado no jornal O Globo.

*As opiniões emitidas nos artigos desta seção são de inteira responsabilidade de seus autores e não expressam, necessariamente, o entendimento do CRM-PR.

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