02/03/2018

Evento da EMC debate ética e judicialização na terminalidade

Palestrantes defenderam a importância de se discutir sobre a morte e de respeitar a autonomia dos pacientes terminais

As implicações éticas e jurídicas na terminalidade foram o tema do segundo encontro do programa de Educação Médica Continuada do Conselho Regional de Medicina do Paraná, em 2018. Realizada na quinta-feira (01/03) no auditório do CRM em Curitiba, o evento contou com a participação da médica Úrsula Bueno do Prado, mestre e doutora em clínica cirúrgica e professora no curso de Medicina da UFPR, e a juíza de Direito Maria Aglaé Tedesco Villardo, com atuação como desembargadora substituta na 21ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro. O vídeo da apresentação em breve estará disponível no Portal do Conselho, que avalia a possibilidade de uma nova edição sobre o tema, este ano, face a grande repercussão positiva.

A atividade do CRM-PR contou com aproximadamente 150 participantes entre presenciais e pela web, com transmissão em tempo real. Coube ao secretário-geral Luiz Ernesto Pujol fazer a abertura oficial, com uma narrativa emocionante. Em sua análise, há um despreparo geral e crescente para lidar com a morte e disso decorrem questões como a judicialização da terminalidade. “As pessoas não entendem mais que a morte é inevitável”, disse. Ele realça a relevância da Resolução CFM n.º 1995/2012, que dispõe sobre as diretivas antecipadas de vontade dos pacientes, ou o chamado testamento vital. A mediação dos trabalhos coube à conselheira Cecília Vasconcelos, coordenadora de EMC do CRM-PR.

clique para ampliarclique para ampliarCons.ª Cecília Vasconcelos (e) com as palestrantes. (Foto: CRM-PR)

O conselheiro Luiz Ernesto Pujol destacou ser comum que, em casos de terminalidade, o médico seja alvo de processos – “afinal, se o paciente morreu é porque algo deu errado”. Assim, não é raro que médicos prolonguem o sofrimento de pacientes terminais com terapêuticas pouco efetivas, para impedir a todo custo que o paciente morra — mesmo quando o diagnóstico é inevitável. Tudo tem origem na falta de diálogo, como analisa a Prof.ª Úrsula Guirro.

A anestesiologista e professora do curso de Medicina da Universidade Federal do Paraná pautou sua fala no princípio de que é necessário conversar sobre a morte e entendê-la como algo natural. “A morte é incômoda só porque a gente não fala sobre”, afirmou.

De acordo com a Prof.ª Úrsula Guirro, falta uma “educação para a morte” dentro dos cursos de Medicina e na sociedade como um todo. Para ela, se o assunto fosse melhor discutido, não só os médicos teriam mais preparo e sensibilidade para cuidar de casos terminais, como as pessoas conseguiriam lidar melhor com essas situações.

Ao longo da palestra, ela expôs as diferentes dimensões que envolvem a morte e de que forma os médicos devem proceder ao lidar com a terminalidade. Para ilustrar, abordou os princípios da bioética, o papel dos cuidados paliativos e algumas resoluções do Conselho Federal de Medicina que contemplam o assunto.

Para ela, “a ação do médico deve sempre estar apoiada no cuidado. Faz parte desse cuidado dar ao paciente a autonomia de decidir se ele quer ou não passar por certos procedimentos. É dever do médico sempre acompanhá-lo e mantê-lo bem informado.”

“Eu tenho que informar o paciente para ele decidir se o tratamento proposto é digno para ele ou não”, afirmou. “Se aquilo não vai curar a doença dele, ele não deve ter o direito de decidir?”. Ela também defende que é possível limitar e suspender tratamentos, mas o conforto do paciente deve ser assegurado sempre. Isso faz parte do conceito de morte digna, diz.

“Eu tenho muito frio nos pés, eu quero morrer de meia, tem algum livro que diga que uma morte digna é morrer de meia?”, exemplificou. “Isso varia de pessoa para pessoa, mas o médico só pode descobrir o que é digno para cada um, pela conversa”.

Aspectos legais

A juíza e doutora em bioética Maria Aglaé Tedesco Villardo foi ao encontro do que a médica expôs em sua fala, defendendo a necessidade de respeitar a autonomia dos pacientes. Ao longo da palestra, ela focou principalmente nos aspectos jurídicos que envolvem a terminalidade, especificamente na terceira idade.

A magistrada destacou que no caso de idosos, há situações em que o médico assume que o paciente não tem capacidade de decidir por conta própria, então segue os procedimentos que julga mais adequados. Mas, legalmente falando, há uma hierarquia a ser respeitada nesses casos.

“Nós, médicos e advogados, temos estudo para informar a pessoa da melhor maneira, para que ela possa fazer sua própria decisão”, disse. “Se a pessoa não pode decidir, um curador vai falar em nome dela, senão os familiares ou, por último, o médico”.

Maria Aglaé também destacou que, apesar de ser um direito inalienável, a vida nem sempre é o bem de maior valor. “A questão é o que a pessoa quer para a própria vida. Eu posso escolher morrer do que viver como uma escrava, por exemplo”, afirmou.

Também coordenadora de mestrado em KJustiça e Saúde da Escola da Magistratura do RJ e associada da Academia Nacional de Cuidados Paliativos, a juíza finalizou a palestra exaltando a importância do estudo para a manutenção da liberdade profissional do médico. Quanto mais conhecimento, mais segurança ele tem da pertinência dos procedimentos que irá realizar. “Ninguém pode abdicar da sua liberdade profissional e isso se conquista pelo estudo”, disse. “Iniciativas como a Educação Médica Continuada contribuem para isso, para dar essa segurança ao profissional”.

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