03/05/2018

Os risologistas e a medicina do afeto

Grupo nascido há 11 anos se propõe a levar alegria e descontração para pacientes de todas as idades e funcionários de hospitais. CRM-PR recebeu 3º Seminário do Riso no fim de semana

O ditado popular já dizia: rir é o melhor remédio. No entanto, há quem subestime o impacto que o riso e o afeto podem ter na nossa saúde. O médico aposentado Roberto Brunow Ventura sentiu isso na pele. Depois de uma vida inteira atuando como anestesista, ele fechou seu consultório e resolveu que estudaria para se tornar palhaço artístico — um sonho de criança que acabou deixando de lado. Hoje, aos 67 anos de idade, atua junto aos Risologistas, um grupo de clowns que realiza visitas lúdicas em hospitais e outras instituições de saúde e também assistenciais.

clique para ampliarclique para ampliarConselho volta a receber seminário da trupe. (Foto: Arquivo)

“Onde eu vou, apresento-me como médico e palhaço. E digo, com muita honra, que virar palhaço me salvou”, afirma. Desde que passou a usar o nariz vermelho, há quatro anos, deixou de beber, de tomar remédios e desenvolveu maior controle emocional. Para ele, o grande problema do ser humano está na forma de como nos relacionamos uns com os outros e a maneira com que encaramos os problemas do cotidiano; o que nos falta em afeto, sobra em estresse. É aí que entram os Risologistas.

Na ativa há 11 anos, o grupo já levou seu trabalho para a Espanha, França e Nova Zelândia e atualmente se apresenta em 17 hospitais no sul do Brasil e em outros espaços culturais. A trupe de palhaços se sustenta sobretudo com a bilheteria de seus espetáculos, doações espontâneas e outros patrocínios.

Diferentemente de outras iniciativas parecidas, durante as visitas aos hospitais os artistas não se restringem à área pediátrica. Médicos, pacientes de todas as idades, enfermeiras, funcionários… Ninguém fica de fora da brincadeira. A ideia é levar a alegria a todos igualmente. “É um trabalho lúdico, mas ele é terapêutico por baixo dos panos”, diz Roberto Brunow, que reforça: “Não tem coisa mais fundamental para o ser humano do que se sentir valorizado”.

clique para ampliarclique para ampliarA ideia é levar alegria ao ambiente hospitalar. (Foto: Arquivo)

Segundo o doutor, o riso nos ajuda a liberar endorfinas e livrar da adrenalina acumulada no dia a dia.  Ele conta de uma visita à enfermaria de cardiologia da Santa Casa de Curitiba, na qual viu um senhor de uns sessenta anos de idade sentado, todo triste, junto da esposa. Foi puxar conversa. Pessoa simples, acolhedora, em indisfarçável sotaque nordestino. Era para ele ter feito uma cirurgia no coração naquela manhã, mas ela acabou sendo adiada.

O médico-palhaço não teve dúvidas e perguntou se poderia contar duas piadas para ele. “Tu não imagina como ele ficou feliz, gargalhou, descarregou toda aquela adrenalina”, relembra. “O médico também tem esses momentos mágicos, mas normalmente acaba deixando passar”.

O médico destaca que essas visitas também ajudam a desconstruir a ideia de que o hospital deve ser um “lugar frio e triste”. O que contribui para melhorar o clima para quem trabalha e se trata ali.

Para Roberto Brunow, o ambiente hospitalar ser tradicionalmente dessa forma tem a ver com o tipo de formação oferecida nos cursos de Medicina. “A faculdade de Medicina forma pessoas para um sistema bruto, no qual o médico não tem tempo para si nem para seus pacientes”, diz. Para ele, falta aos médicos a sensibilidade que o palhaço possui para lidar com as pessoas.

“É preciso voltar às nossas raízes, aos nossos princípios reais e largar mão dessa ideia de querer ser médico para ganhar dinheiro”, diz. “O palhaço para mim é um caminho para mostrar isso”.

Humanização

Todo o trabalho dos Risologistas se baseia no conceito de humanização, como explica o diretor geral do grupo, Alfredo Cruz. “Nossa ideia de humanização é nos colocar no lugar do outro, ter empatia”, diz. Por isso, ele considera importante que o grupo expanda suas fronteiras, levando essa filosofia para além dos hospitais.

clique para ampliarclique para ampliarIntegrantes do grupo em plena ação. (Foto: Arquivo)

De acordo com ele, a falta de acesso à cultura e à cidadania, também são fatores que de alguma forma levam ao adoecimento. Por isso, um dos próximos passos para os Risologistas é levar espetáculos e palestras para bairros carentes de Curitiba: a iniciativa funcionaria como uma espécie de prevenção pelo riso.

Em agosto do ano passado, eles também realizaram o primeiro Seminário do Riso no Conselho Regional de Medicina do Paraná (CRM-PR). Durante um final de semana, foram ministradas palestras, dinâmicas e apresentações voltadas à humanização no ambiente hospitalar. O evento contou com a participação de 45 estudantes de Medicina entre o primeiro e terceiro ano da graduação — uma adesão comemorada pelo grupo. Devido a esse sucesso, eles planejam fazer uma outra edição do Seminário no CRM, neste começo de maio.

“Nessas horas que alguma sementinha pode ser plantada e, lá pra frente, o cara, em vez de dar um coice no paciente, vai saber que ali está um ser humano que merece respeito igualzinho a ele”, afirma Roberto Brunow. Essa semente também pode dar frutos mais cedo. Normalmente são nesses momentos que se desperta o interesse das pessoas em participar do projeto, que conta com palhaços profissionais e voluntários que atuam em outras áreas.

Todos essas iniciativas se sustentam no diálogo entre a arte do palhaço e a arte do médico. Assim como Roberto Brunow trouxe sua bagagem da Medicina para o mundo dos clowns, hoje Alfredo Cruz faz o contrário. Ele, que antes de fundar os Risologistas era professor, está no segundo ano do curso de Medicina na Universidade Positivo (UP) — um sonho antigo que finalmente realizou.

Ele conta que chegou na graduação com “dez anos de hospitais nas costas” e muita vontade de discutir novos modelos para um atendimento mais humano. E foi no ambiente acadêmico que percebeu algo importante: a Medicina é fundamentada na humanização, ela, por si só, segue nessa direção. “A Medicina é uma arte muito humana”, diz. “A questão é não deixar que outras coisas mudem isso e nos desviem desse caminho”.

Voluntariado

Atualmente outros três atores fazem parte dos Risologistas: Jhonatan Mazo (também fundador dos Risologistas), Alan Cesar Soares e Tayssa Camila Mazetto — que estão na trupe desde 2010. Mas, além dos palhaços profissionais, o grupo conta com 20 voluntários que participam das visitas aos hospitais e outras apresentações. Para fazer parte do voluntariado não é necessário ter experiência prévia como palhaço ou ator, basta ter vontade de aprender e de levar alegria aos outros.

clique para ampliarclique para ampliarMédico Roberto Brunow em palestra no Conselho. (Foto: Arquivo.)

Para capacitar os voluntários, são promovidos encontros quinzenais nos quais se discute a humanização da Medicina e se ensinam técnicas de clown e atuação. Afinal, é como diz o doutor Roberto Brunow: “ser palhaço é coisa séria, não é só colocar o nariz vermelho e fazer piada, é algo que exige estudo e dedicação”.

Quem tiver interesse em se juntar aos Risologistas e quiser mais informações sobre esses encontros e oficinas, pode entrar em contato pelo número (41) 99796-7306 ou então pelo email risologistasdr@risologistas.com.br.

Saiba mais sobre outros projetos desenvolvidos pelo grupo no site http://www.risologistas.com.br/

SERVIÇO:

3.º Seminário do Riso

Data: 5 e 6 de maio, das 9 às 18h

Local: Auditório do CRM-PR (Rua Victório Viezzer, 84, Vista Alegre, Curitiba - PR).

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