Rankings de universidades não são piada

Rogerio Meneghini

Uma pergunta que não cala é: por que esta necessidade de procurar padrões que unem ou diferenciam tudo o que existe? A resposta de Umberto Eco, em seu livro "A Vertigem das Listas" (ed. Record), é porque se trata de um imperativo atávico de dar ordem ao caos.

Nestes últimos anos, as universidades mundiais foram surpreendidas por iniciativas de se avaliá-las e classificá-las que se sucederam.

A complexidade que engloba as atividades acadêmicas fez com que enfoques diversificados que vêm sendo ensaiados pelos diferentes rankings universitários produzam resultados que, comparativamente, podem parecer randômicos.

É preciso, porém, considerar que há uma sondagem diversificada pelos rankings, que miram as universidades sob múltiplos ângulos. É plausível que os resultados destoantes soem estranhos para os leigos.

Mas não deveriam receber o estigma de "piada" por pesquisadores, professores e muito menos por autoridades brasileiras do setor acadêmico-científico, que recentemente assim os qualificaram publicamente, argumentando haver por trás dos rankings um interesse comercial.

É plausível haver interesse comercial por parte dos produtores de rankings, os quais são na maioria órgãos de imprensa. Mas faz, hoje, sentido defender que esse interesse necessariamente inviabilize a ética de um procedimento e não permita superar conflitos de interesse?

Essa ameaça pode, em certas circunstâncias, estar presente, porém ela tende a ser anulada à medida que a metodologia de elaboração de rankings se aprimora e há uma multiplicidade de iniciativas ocorrendo simultaneamente.

É interessante notar que o governo brasileiro, por meio do Ministério da Educação (MEC), vem já há algum tempo operando com uma classificação de universidades.

Obviamente, ela não leva o nome de ranking, mas utiliza indicadores para qualificar, dentre mais de 2.000 instituições brasileiras de nível superior, quais podem ser classificadas como universidades. Atualmente, elas somam 195.

Num exame preliminar, a maioria das universidades públicas e privadas de maior porte e maior número de formados está ali presente.

Há, contudo, uma discrepância entre o que o MEC entende por universidade e a concepção mundial de universidade - isto é, uma instituição de educação superior e pesquisa que confere títulos acadêmicos numa variedade de tópicos e provê ensino em nível de graduação e pós-graduação.

O primeiro ranking brasileiro de universidades, o RUF (Ranking Universitário Folha), que utiliza 16 indicadores para classificá-las, mostra que mais da metade das nossas universidades tem atividade de pesquisa praticamente nula, buscando por um alunato de graduação alentado, com forte interesse comercial.

Se for importante para o MEC mantê-las na categoria de universidade, seria mais adequado chamá-las de universidades de ensino, subentendendo-se ensino de graduação, pois é claro que, sem pesquisa, não pode haver um genuíno ensino de pós-graduação.

Se o RUF fosse considerar universidade no "stricto sensu", então cerca de metade das universidades no sentido compreendido pelo MEC seriam desqualificadas.

Vê-se, portanto, porque dois rankings podem fornecer resultados muito distintos, dependentes do ângulo com que se mira.

Artigo de Rogerio Meneghini, 73, diretor científico do SciELO, professor titular aposentado da USP, membro da Academia Brasileira de Ciências e responsável pela medição científica do RUF. Publicado no jornal Folha de S. Paulo.

*As opiniões emitidas nos artigos desta seção são de inteira responsabilidade de seus autores e não expressam, necessariamente, o entendimento do CRM-PR.

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