28/06/2006

Reorganização do ensino superior pode frear escolas sem qualidade

Entre as alterações importantes no reconhecimento e renovação dos cursos estão a incorporação do Enade, a opinião dos conselhos profissionais e a reorganização de competências internas do MEC.


O País recordista no número de escolas médicas não pára de "melhorar" o seu desempenho. O mês de maio fechou com 156 cursos, com oferta total de 13.605 vagas para o primeiro ano. De 2000 para cá, foram abertas 57 escolas - 43 delas privadas -, sendo duas somente este ano, com 180 vagas. Com a existência de faculdades não reconhecidas em funcionamento e outras tantas sendo esboçadas Brasil afora - seis somente no Paraná -, uma das grandes expectativas para frear os abusos está depositada nos efeitos do decreto-ponte recém-sancionado pelo Presidente da República, que pressupõe a reoorganização do ensino superior. Em alguns deles, como de Medicina, está prevista a participação dos conselhos profissionais no processo de reconhecimento de cursos.

"Se um curso está formando maus profissionais, quem melhor que os conselhos para apontar isso?", sustenta o ministro da Educação, Fernando Haddad, ressaltando que a avaliação dos conselhos será um dos aspectos analisados pelo MEC para reconhecer o curso. Outro ponto relevante serão as avaliações no Sinaes (Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior), que examina o desempenho dos estudantes por meio de uma prova (o Enade), além das condições dos cursos e das instituições. Para os cursos de Direito, a posição do Conselho Federal da OAB terá papel preponderante, assim como o do Conselho Nacional de Saúde para os cursos de Medicina, Odontologia e Psicologia.

"Queremos chamar a sociedade, por meio desses conselhos, para definir se o curso tem relevância e qualidade para continuar existindo", reforçou o ministro, que não deixou de mencionar estatísticas do Cremesp indicando que o índice de denúncias contra médicos formados nas escolas com as piores notas nos exames nacionais de alunos é mais que o dobro da verificada contra profissionais oriundos das faculdades com melhores avaliações. "Dados como esse precisam ser aproveitados", assinalou Haddad ao lembrar que a posição de cada órgão estará restrita aos cursos de sua área.

Para começarem um curso, as faculdades precisam pedir autorização ao Ministério da Educação. O reconhecimento é indispensável para que os diplomas dos alunos tenham validade. Os pedidos de renovação deverão ser analisados a cada três anos, também com a participação de conselhos profissionais. O novo decreto prevê que, quando forem constatadas irregularidades nas instituições, o MEC deverá estipular um prazo para que as deficiências sejam corrigidas. Protocolos não cumpridos podem ocasionar a desativação de cursos e habilitações, intervenção, suspensão temporária de prerrogativas da autonomia ou até o descredenciamento.

"A atuação do MEC hoje é prejudicada pela ausência de parâmetros processuais claros, muitas vezes revertidos judicialmente por absoluta falta de clareza e transparência. Por isso mesmo, o decreto-ponte redimensiona o arcabouço jurídico de regulação, supervisão e avaliação do ensino, racionalizando o trâmite rotineiro dos processos administrativos. Não há nenhuma intenção de antecipar temas da reforma universitária. Ele trata de processos formais, enquanto a reforma trata de tipologia e conceitos substanciais", destaca o ministro.

As regras também alcançam novas turmas, cursos congêneres e toda alteração que importe aumento no número de estudantes da instituição ou modificação das condições constantes do ato de credenciamento, o que mereceu elogio do presidente do CRM-PR, Hélcio Bertolozzi Soares. Ele espera que o decreto possa, de fato, interromper a verdadeira avalanche de escolas de cunho meramente mercantilista que se vislumbra no País. Coordenadores de cursos de Medicina do Estado viram aspectos altamente favoráveis nas novas normas, em especial no que se refere à perspectiva de melhoria da qualidade do ensino.

O que prevê o decreto
O Decreto nº. 5.773/06 , publicado dia 10 de maio, "dispõe sobre o exercício das funções de regulação, supervisão e avaliação de IES e cursos superiores de graduação e seqüenciais no sistema federal de ensino". Com o propósito de distribuir melhor as tarefas entre os diferentes órgãos da Casa para garantir o aumento da qualidade da educação, o decreto regulamenta pontos da Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB) e da Lei nº 10.861/2004, que instituiu o Sinaes. Com isso, foram revogadas 40 portarias que tratam do tema.
O decreto-ponte faz uma espécie de fechamento de uma série de medidas de qualificação do ensino superior no país. Destacam-se entre elas a recomposição do custeio e a expansão das vagas do parque universitário federal, o encaminhamento ao Congresso da reforma universitária e as iniciativas inéditas de inclusão social e de ampliação do acesso criadas pelo Programa Universidade para Todos (ProUni).

O Conselho Nacional de Educação (CNE) será o responsável por todo o processo de credenciamento e renovação de credenciamento de qualquer instituição de ensino superior. É o próprio conselho que deve traçar as diretrizes para que o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) avalie a estrutura das instituições antes de elas ganharem o credenciamento ou não. Os estudantes poderão saber as condições de funcionamento da faculdade e situação do curso no site do Inep (www.inep.gov.br), bem como acompanhar os resultados do Enade e possíveis pendências administrativas da instituição escolhida e que podem refletir na qualidade do ensino.

 O SINAES compreende os seguintes processos de avaliação institucional: interna e externa das instituições de educação superior, de cursos de graduação e do desempenho acadêmico dos estudantes de cursos de graduação.

 De acordo com o artigo 74, os processos de autorização, reconhecimento e renovação de reconhecimento de cursos em tramitação no CNE e já distribuídos aos respectivos conselheiros relatores seguirão seu curso regularmente. Os processos ainda não distribuídos deverão retornar à Secretaria competente do Ministério da Educação.


O risco

O risco de uma verdadeira avalanche de novos cursos privados de Medicina no Paraná foi apresentado durante reunião plenária do CRM-PR. Na oportunidade, conforme análise dos delegados representantes e conselheiros, estariam em articulação, nas mais diferentes etapas, as implantações de escolas em Curitiba, Ponta Grossa, Pato Branco, Guarapuava, Foz do Iguaçu, Cascavel e Maringá.


Escolas irregulares em MG

Minas Gerais está perto de ganhar a sua 22ª escola médica. O Ministério da Educação já autorizou o funcionamento da Faculdade de Medicina da Federal de Ouro Preto, a 95 km de Belo Horizonte. Das existentes, 16 são privadas e seis deles não possuem autorização do MEC, Conselho Nacional de Saúde e Conselho Nacional de Educação para funcionar. Com denúncia do Conselho de Medicina de Minas, o Ministério Público Federal apura as irregularidades na geração de cerca de 300 vagas entre as 1.910 hoje ofertadas. Três dos cursos estão funcionando com autorização do Conselho Estadual de Saúde.


Desempenho do Enade

O desempenho dos alunos e dos cursos de Medicina paranaenses foi bastante positivo no Enade 2004. O resultado, recém-divulgado e que tende a ser valorizado com o advento do decreto-ponte n.º 5.773, indica os cursos com conceito 5 e 4. A UnicenP foi a única escola médica do Estado ausente no exame, por ter iniciado suas atividades em 2002. A Universidade Estadual de Maringá foi a que alcançou a maior média final entre as paranaenses - 4,4 -, ficando ligeiramente atrás das que obtiveram o melhor escore (4,5). Outros três cursos obtiveram o conceito 5: a Universidade Estadual de Londrina, com média 4,3; a Estadual do Oeste do Paraná (Cascavel), com 4,2; e a Evangélica do Paraná, com 4. A PUC-PR e a Universidade Federal do Paraná conseguiram média 3,9 e ficaram com conceito 4.

Ao todo, 89 cursos de medicina foram avaliados, sendo que outros 30 não passaram pelo processo. Foram 26 com o conceito 5, 52 com o 4, mais 10 com o 3 e um com o conceito 1. A PUC Campinas e Federais de São Paulo e Minas Gerais obtiveram a média mais alta: 4,5. O pior desempenho coube à Universidade de Pernambuco, no Recife, seguida da Universidade de Brasília, a Federal de Pernambuco, Iguaçu de Itaperuna (RJ) e Marília (SP).


Evangélica amplia vagas

A Faculdade Evangélica do Paraná, com sede em Curitiba, foi autorizada pelo Ministério da Educação a aumentar de 60 para 100 o número de vagas anuais em seu curso de Medicina. O Diário Oficial da União publicou em 22 de maio último a homologação do Parecer n. 140/2006 da Câmara de Educação Superior do Conselho Nacional de Educação. Com a ampliação, o Paraná passa a contar com 666 vagas para ingresso nos sete cursos de Medicina existentes.


Busca da revalidação

A Universidade do Sul de Santa Catarina (Unisul), Campus de Tubarão, foi credenciada pela UFSC para receber no semestre 54 médicos formados em outros países. O grupo cursa três disciplinas isoladas, em caráter de extensão, visando a revalidação de seus diplomas, obtidos em escolas médicas da Bolívia, Argentina, Peru e Chile. A Unisul de Tubarão é uma instituição privada, foi fundada em 1998 e oferece 30 vagas, o mesmo número de seus Campus de Pedra Branca (SC), aberto em 2005.

UFPR suspende revalidação de diplomas por dois anos
Moratória nos processos decorre da necessidade de transformações curriculares.

O Conselho Setorial do Setor de Ciências da Saúde da Universidade Federal do Paraná determinou a suspensão, pelo prazo de dois anos, de processos de revalidação de diplomas de cursos superiores da área de saúde, obtidos em instituições de ensino superior no Exterior. A moratória vale não só para os formados em Medicina fora do País mas, ainda, para os de Enfermagem, Farmácia, Nutrição, Odontologia e Terapia Ocupacional.

De acordo com nota explicativa constante do site do Setor de Ciências da Saúde da UFPR (www.saude.ufpr.br/corpo.htm), a suspensão do processo decorreu da necessidade de transformações curriculares nos referidos cursos, determinadas pelas diretrizes curriculares emanadas do Ministério da Educação. Conforme a posição oficial, a suspensão ocorreu em 1.º de maio último e terá validade por 24 meses.

Com a medida, fica suspensa a realização de processos de revalidação no Paraná para formados em Medicina, já que a Federal era a única instituição habilitada para tal finalidade, obrigando assim os interessados a recorrer a escolas médicas públicas de outros Estados. Para o processo de 2005, iniciado ainda em 2004, nada menos do que 300 pessoas com graduação no Exterior em Medicina - a maioria da Bolívia - procuraram a UFPR para tentar obter a revalidação. Dos candidatos, cerca de 170 compareceram para as fases de exames e provas. Contudo, para o exercício, houve a limitação em 30 inscritos para a revalidação, conforme resolução setorial de 2004. Nenhum dos postulantes foi aprovado nas etapas determinadas. O Conselho de Medicina do Paraná tem atualmente 21 médicos exercendo a Medicina no Paraná mediante registro provisório, com liminar judicial. Os registros obrigatoriamente devem ser renovados a cada 120 dias.

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