A qualificação do ambiente de trabalho



Há estimativas de que, no mundo, faltem hoje milhões de profissionais de saúde. Essa é a trágica realidade das populações de países pobres e ricos. Realidade compreensível, mas inaceitável nos países pobres; igualmente inaceitável, mas incompreensível em países desenvolvidos.


Como aceitar que, em um Brasil, proclamado emergente e dito autossuficiente, deixe centenas de municípios e milhares de brasileiros desassistidos, dispondo de mais de 340 mil médicos e 170 mil enfermeiros em atividade?


Coexistem, de fato, e em muitos países, excesso de profissionais de saúde em algumas áreas - as mais desenvolvidas - e absoluta escassez em outras - as esquecidas por seus governantes.


As razões para a distribuição iníqua de profissionais de saúde são muitas, complexas às vezes, e interdependentes sempre. Incluem-se aqui riscos ocupacionais, violência física e psicológica, sobrecarga de trabalho, remuneração insuficiente, oportunidades limitadas de desenvolvimento na carreira. Predomina nesse contexto a péssima qualidade do ambiente de trabalho, prejudicando o desempenho e afastando dele os profissionais.


Esse é, sem dúvida, um dos mais graves problemas de saúde do mundo de hoje.


É necessário transformar o ambiente de trabalho, de sorte a atrair e fixar aqueles que trabalham com saúde, melhorando a satisfação e o resultado da assistência às pessoas.


Quais são as intervenções necessárias para qualificar positivamente o ambiente de trabalho?


1 - Reconhecimento profissional. É essencial reconhecer as competências das diferentes profissões, dar-lhes autonomia e autocontrole verdadeiros, premiar pelo envolvimento e desempenho, monitorar a satisfação dos trabalhadores.


2 - Gerenciamento de Recursos Humanos. Tem-se aqui que garantir oportunidades iguais e tratamento apropriado, compensação adequada, efetivo gerenciamento do desempenho, benefícios reais e expressivos, envolver os profissionais no planejamento e na tomada de decisões, estimular a comunicação e o trabalho em equipe, incentivar uma cultura de confiança recíproca e respeito entre as pessoas, adotar políticas que estimulem o registro de falhas, definir as responsabilidades de cada um dos envolvidos.


3 - Estruturas de apoio. Falta investir no ambiente de trabalho, fortalecer as relações entre os seus integrantes, fornecer equipamentos e suprimentos adequados, envolver os profissionais em processos de avaliação contínua, promover equilíbrio sadio entre vida e trabalho, assegurar que a prática se faça dentro de um código de ética claro e bem estabelecido, divulgar e estimular padrões de boas práticas, revisar o escopo da prática e as competências de cada um. Em suma, oferecer oportunidades para o desenvolvimento profissional.


Surpreende que, apesar do acúmulo de evidências nesse campo, as autoridades encarregadas de geri-lo continuem a ignorar as soluções e insistam em propostas vazias, gastando precioso tempo, energia e dinheiro público tentando legitimá-las. Vem deles apenas programas desgastados como a importação de profissionais do exterior, serviço social obrigatório, descaracterização do escopo das profissões e transferência de responsabilidades sem correspondente qualificação, farta distribuição de diplomas tentando distribuir profissionais por transbordamento, limitando as alternativas sorte a tangê-los ao que julgam ser a prioridade do momento.


A lista de despautérios é longa e, infelizmente, não se limita às brevemente citadas acima.


Até quando nos deixaremos assim mal conduzir?


Até quando nossa sociedade tolerará falta de seriedade e competência no trato de assuntos que lhe dizem tão de perto?



Artigo escrito por:


José Luiz Gomes do Amaral,

Presidente da Associação Médica Brasileira, e

Maria Goretti David Lopes,

Presidente da Associação Brasileira de Enfermagem

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