Antes e depois. Por que não pode?

Thadeu Brenny Filho

A Resolução CFM n° 1.974/2011 estabelece os critérios norteadores da propaganda em Medicina, conceituando os anúncios, a divulgação de assuntos médicos, o sensacionalismo, a autopromoção e as proibições referentes à matéria.

A publicidade médica deve obedecer exclusivamente a princípios éticos de orientação educativa, não sendo comparável à publicidade de produtos e práticas meramente comerciais (Capítulo XIII, artigos 111 a 118 do Código de Ética Médica).

O atendimento a esses princípios é inquestionável pré-requisito para o estabelecimento de regras éticas de concorrência entre médicos, serviços, clínicas, hospitais e demais empresas registradas nos Conselhos Regionais de Medicina.

Em seu art. 2º, a Resolução CFM n°1.974/2011 fixa que “os anúncios médicos deverão conter, obrigatoriamente, os seguintes dados: nome do profissional; especialidade e/ou área de atuação, quando registrada no Conselho Regional de Medicina; número da inscrição no Conselho Regional de Medicina; e número de registro de qualificação de especialista (RQE), se o for; sendo este registro obtido com a conclusão de uma residência médica oficial e/ou prova de título na especialidade requerida conforme edital da Sociedade de Especialidade.”

O artigo 3º da mesma norma, em seu item ‘g’, inicia o embate do título da matéria: “Expor a figura de seu paciente como forma de divulgar técnica, método ou resultado de tratamento, ainda que com autorização expressa do mesmo, ressalvado o disposto no art.10 desta resolução (em eventos ou  trabalho científico)”. E ainda o item ‘k’: “Garantir, prometer ou insinuar bons resultados do tratamento”.

Observamos, então, a necessária regulamentação, pois a Medicina é uma arte a prover todos os meios para determinado fim; não é uma arte em que se pode prometer um determinado resultado e isto é obvio pela variabilidade de cada paciente em suas características morfoantropométricas (que são mensuráveis), além da resposta imune de cada paciente, variações de textura de pele, músculo etc.

O principal motivo pelo qual o CFM estabelece a proibição de publicação das fotos antes e depois é a valorização da conduta ética no exercício da Medicina. Além disso, o Conselho tenta preservar o médico de eventuais processos movidos por terceiros em busca de indenizações por danos decorrentes de abusos. Outro motivo para proibir a divulgação dessas fotos é evitar a autopromoção e o sensacionalismo do médico (art. 9º), porque pode induzir a promessas de resultados, e danoso ao médico quando o que prometeu não efetivou na satisfação de seu paciente com o resultado obtido.

O artigo 13º da Resolução 1974/2011 necessitou correção (na Resolução CFM 2126/2015) e vigora explicitamente (em seu parágrafo 2°): “É vedada a publicação nas mídias sociais de autorretrato (selfie), imagens e/ou áudios que caracterizem sensacionalismo, autopromoção ou concorrência desleal.

O parágrafo seguinte (3°), também indica ser vedado ao médico e aos estabelecimentos de assistência médica a publicação de imagens do “antes e depois” de procedimentos, conforme previsto na alínea “g” do mesmo artigo 3º da Resolução.

Como realçado pelo parágrafo 4°, “a publicação por pacientes ou terceiros, de modo reiterado e/ou sistemático, de imagens mostrando o “antes e depois” ou de elogios a técnicas e resultados de procedimentos nas mídias sociais deve ser investigada pelos Conselhos Regionais de Medicina.

Em Introduction à l’étude de la médecine (H. Roger, 1930), o mestre francês abre seu livro com a definição clássica: “A Medicina é uma ciência e uma arte. A ciência estuda as doenças. A arte se ocupa da manutenção e do restabelecimento da saúde”. E acrescento: às características do trabalho intelectual e de habilidade manual de cada profissional médico, de um mesmo procedimento, os resultados corporais são diferentes para o pretendido (a promessa do resultado) ou para uma insatisfação e possível incômodo legal.

Por isso, o regramento ético é e deve ser restrito como proteção às partes. Ao paciente, para fugir do sensacionalismo e autopromoção do profissional médico, que se expõe em publicidade de todos os meios. E ao médico, orientando-o na moderação e bom senso. Afinal, eu nunca vi uma imagem ruim do “depois” nas redes sociais!

Convém ainda ressaltar que a medicina de massa dos nossos dias, resultado ‑ entre outras causas ‑ da explosão populacional e do subdesenvolvimento, se exerce entre populações em condições de dependência externa, que agravam a tendência regressiva interna. Por isso, a relação médico-paciente deverá ser também educativa. Não se trata da repetição artificial de clichês sociais, de ser cortês. Às vezes precisamos até ser rudes.

A relação médico-paciente é uma vinculação que atualiza o passado. Abrange a complexidade dos sistemas existenciais e exige um mínimo de criatividade ante às solicitações de origem interna ou externa que envolvem todas as áreas da personalidade – a mental, a somática e a espaço temporal. A prática clínica nos ensina o quanto são instáveis as reações humanas nas respostas aos desafios da vida. Ademais, nenhuma outra atividade confere ao profissional tantas oportunidades de conhecimento da realidade da humana contingência1.

*Thadeu Brenny Filho é conselheiro do CRM-PR e membro da Codame – Comissão de Divulgação de Assuntos Médicos.

**As opiniões emitidas nos artigos desta seção são de inteira responsabilidade de seus autores e não expressam, necessariamente, o entendimento do CRM-PR.

Referência bibliográfica:

  1. http://humanos.cfm.org.br/2019/09/02/a-medicina-como-profissao-arte-e-ciencia/

 

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