Antes e depois, por que não pode?

Eduardo Murilo Novak

Todo médico precisa estar devidamente inscrito no Conselho Regional de Medicina de seu Estado se quiser atuar. Uma vez que faça parte do rol dos profissionais, deverá seguir as normas exaradas por esse seu órgão. Essas premissas parecem lugar-comum, mas é necessário tê-las em mente para explicar o título deste artigo.

Ao médico é vedado colocar imagens que mostram situações “antes” de um procedimento, e “depois”. Assim, por força dessas normas, aquele nariz adunco que se tornou perfeito após o bisturi do doutor não pode figurar nos materiais de divulgação do trabalho do médico. Num primeiro momento, alguns poderiam dizer que isso é um cerceamento à sua liberdade profissional, mas basta racionalizar um pouco para entender as reais justificativas para a existência dessas balizas.

Ao médico é defeso fazer autopromoção, concorrência desleal e sensacionalismo. Mas, além disso, não exibir fotos de “antes” e “depois” visa também proteger o próprio esculápio. Ora, como assim?

Simples. Se um médico colocou em suas redes sociais os resultados de uma cirurgia com finalidade de propaganda, cujo objetivo principal é o de mostrar o quanto a sua ferramenta de trabalho é arguta e precisa, deve-se entender que o paciente, que é o real destinatário daquela publicidade, entenderá que caso venha a ser operado com aquele médico esperará, no mínimo, um resultado semelhante.

“Se o profissional atingiu o resultado com aquele paciente da fotografia, então o mínimo que ele deverá ter comigo é aquele sucesso; não aceito nada diferente daquilo”. A frase será uma afirmação razoável daquele que está programando ser submetido ao procedimento semelhante com aquele profissional.

Há muitas queixas de que a cirurgia estética está categorizada erroneamente como aquelas que têm obrigação de resultado. Abster-se de colocar fotos com resultados promissores contribui para, no longo prazo, os julgadores irem entendendo que as reações orgânicas naturais de cada indivíduo têm um papel essencial no desfecho clínico; e que há falhas que, embora indesejadas, independem da atuação médica. Esse fator “álea” passará a ser, enfim, entendido em sua essência.

Em suma, evitar a “promessa” de um resultado tomando como base fotografias de um outro paciente, ou mesmo simulação em softwares daquele próprio que deseja ser operado, é o primeiro passo para o médico ir paulatinamente esclarecendo que corpo humano é corpo humano, e não computador. Acredite: tem quem ache que sejam a mesma coisa.

 

Dr. Eduardo Murilo Novak é médico especialista em Ortopedia e Traumatologia e Cirurgia de Mão, mestre e doutor em Cirurgia, professor adjunto de Ética e Bioética da UFPR e de Bioética da PUCPR. É conselheiro do CRM-PR e presidente da Sociedade Brasileira de Ortopedia e Traumatologia – Seção Paraná (SBOT-PR). Também é graduado em Direito.

**As opiniões emitidas nos artigos desta seção são de inteira responsabilidade de seus autores e não expressam, necessariamente, o entendimento do CRM-PR. 

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