A Resolução CFM nº 2.427/2025, que revisa os critérios éticos e técnicos para o atendimento a pessoas com incongruência e/ou
disforia de gênero, foi publicada nesta quarta-feira (16) pela autarquia federal no Diário Oficial da União
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O relator da Resolução CFM Nº 2.427/2025,
Raphael Câmara, e diretores do Conselho detalharam à imprensa as regras previstas no texto. (Foto: CFM)
Preocupado em colaborar com a melhoria da assistência
em saúde às pessoas com incongruência de gênero, o Conselho Federal de Medicina (CFM) publica, nesta
quarta-feira (16) no Diário Oficial da União (DOU), a Resolução nº 2.427/2025, que revisa
os critérios éticos e técnicos para o atendimento a pessoas com incongruência e/ou disforia de
gênero.
O texto aprovado pelo plenário do CFM resultou
de longo processo de discussão e análise. Além de aspectos éticos e legais, foram analisados estudos
clínicos sobre o assunto e experiências em outros países na tentativa de formular um documento moderno
e ancorado em critérios técnicos sólidos.
A resolução orienta os médicos
sobre como atuar nos procedimentos, que incluem hormonioterapia, acompanhamento psiquiátrico, protocolos cirúrgicos
e bloqueadores hormonais de puberdade. A resolução traz ainda o Projeto Terapêutico Singular (PTS), um
conjunto de propostas de condutas terapêuticas articuladas, resultado da discussão coletiva de equipe multiprofissional
e interdisciplinar a partir da singularidade dos sujeitos assistidos, permitindo, assim, promover atenção em
saúde integral.
Terapia Hormonal
Cruzada
Sobre a administração de hormônios sexuais para induzir características
secundárias condizentes com a identidade de gênero do paciente, a terapia hormonal cruzada, fica vedada antes
dos 18 anos de idade. A medida é semelhante ao que estabelece a Portaria nº 2.803/2013, do Ministério da
Saúde, que redefine e amplia o Processo Transexualizador no Sistema Único de Saúde (SUS). A resolução
anterior do CFM estabelecia 16 anos como idade mínima.
O paciente que optar por terapia hormonal cruzada deverá: iniciar avaliação médica,
com ênfase em acompanhamento psiquiátrico e endocrinológico, por, no mínimo, um ano antes do início
da terapia hormonal; obter avaliação cardiovascular e metabólica com parecer médico favorável
antes do início do tratamento; e, além da disforia, não apresentar doença psiquiátrica
grave ou qualquer outra doença que contraindique a terapia hormonal cruzada.
O relator da resolução, o conselheiro federal Raphael Câmara, ressalta
que, entre os riscos da hormonioterapia cruzada, estão: aumento de doenças cardiovasculares e hepáticas,
incluindo câncer; fertilidade reduzida; calvície e acne, no caso da testosterona; e, no caso do estrogênio,
maior risco de câncer de mama, problemas tromboembólicos, entre outros.
Procedimentos cirúrgicos
A Resolução CFM
nº 2.427/2025 também estabelece que os procedimentos cirúrgicos de afirmação de gênero
poderão ser realizados após acompanhamento prévio por equipe médica durante, no mínimo,
um ano. Ficam vedados em pessoas com menos de 21 anos, quando as cirurgias implicarem potencial efeito esterilizador, conforme
a Lei nº 14.443, de 2022.
Bloqueador
hormonal
O relator da resolução, Raphael Câmara, ressalta que “o uso de bloqueador
hormonal para a supressão da puberdade em crianças e adolescentes é motivo de discussões e questionamentos
cada vez mais frequentes que levou, inclusive, o Reino Unido a abolir o uso em abril do ano passado”.
“A maioria dos riscos físicos associados aos bloqueadores
da puberdade é devida ao seu efeito de suprimir a produção de hormônios sexuais. A exposição
a hormônios sexuais é importante para a resistência óssea, para crescimento adequado e para o desenvolvimento
de órgãos sexuais. Consequentemente, densidade óssea reduzida, altura alterada e fertilidade reduzida
podem ocorrer como resultados do tratamento”, observa Câmara.
O relator pontua que nações como Suécia, Noruega, Finlândia e Inglaterra
revisaram suas diretrizes e restringiram o uso de bloqueadores de puberdade e hormonioterapia para menores, refletindo a necessidade
de mais pesquisas e uma abordagem mais cautelosa na prescrição desses medicamentos.
“Especialistas destacam a necessidade de mais estudos de longo prazo para entender
completamente os efeitos dos bloqueadores de puberdade, tanto físicos quanto psicológicos. A evidência
atual é limitada e muitas vezes baseada em estudos de curto prazo. Como a prática mostrou que não são
inócuos ou facilmente reversíveis, está havendo regressão na recomendação de seu
uso”, sublinha Raphael Câmara.
A
vedação dos bloqueadores não se aplica a situações clínicas reconhecidas pela literatura
médica, como puberdade precoce ou outras doenças endócrinas, nas quais o uso de bloqueadores hormonais
é cientificamente indicado.
A resolução
O
Art. 1º da Resolução considera as seguintes definições:

O
Art. 2º diz que o atendimento integral à saúde da pessoa com incongruência ou disforia de gênero
deve contemplar as suas necessidades, garantindo o acesso a cuidados básicos, especializados e de urgência e
emergência com acolhimento e escuta qualificada, garantindo ambiente de confiança e confidencialidade.De acordo com a resolução, todas as informações
devem ser claras, objetivas e atualizadas sobre as possibilidades terapêuticas, ressaltando os riscos, as limitações
e os potenciais efeitos adversos dos tratamentos propostos. Deve haver encaminhamento e trabalho conjunto com equipes multidisciplinares
dentro da área médica e garantia de que a tomada de decisão terapêutica seja pautada nas melhores
evidências disponíveis, utilizando protocolos reconhecidos e aprovados pelo CFM, assim como normas éticas
vigentes.Sobre a segurança do ato médico
e do paciente, a resolução estabelece que, antes de cada etapa terapêutica, o médico responsável
pela prescrição ou procedimento deve informar o seu paciente, sempre em linguagem compreensível, sobre
os benefícios, os riscos, as possíveis complicações e a reversibilidade, ou não, das intervenções
que estão propostas a serem realizadas.Menores
de idade
No caso do paciente menor de idade, as informações devem ser compreendidas tanto pelo
paciente como por seus representantes legais. As informações devem constar no termo de consentimento livre e
esclarecido, que deve ser assinado pelo paciente, se maior de 18 anos, ou pelos representantes legais, no caso do paciente
menor de 18.Os pacientes menores de idade
necessitarão assinar o termo de assentimento livre e esclarecido, que deverá estar adaptado para a sua compreensão.
Toda e qualquer documentação (termos de assentimento/consentimento, atestados, evoluções clínicas,
relatórios, pareceres e laudos) deve ser mantida em prontuário, garantindo segurança, sigilo e rastreabilidade
das informações.
Em casos de arrependimento ou destransição,
o médico deve oferecer acolhimento e suporte, avaliando o impacto físico e mental e, quando necessário,
redirecionando o paciente a especialistas adequados.
Fonte: CFM