O consumo seguro depende de tratamento com rigoroso acompanhamento clínico, para evitar erros ou abuso que, muitas vezes,
levam à dependência química
Como parte de estratégia iniciada ainda no ano passado, o Conselho Regional de Medicina do Paraná vem implementando ao
longo deste ano uma série de ações voltadas a conter os abusos nas prescrições, uso e circulação de substâncias anoréticas.
Além de buscar cooperação técnica com as sociedades médicas de especialidades afins à questão, para uniformização de procedimentos
na formulação de anorexígenos, o CRM tem fortalecido suas iniciativas - inclusive fiscalizadoras - graças a integração com
outras instituições, como o Conselho Regional de Farmácia, Ministério Público, Vigilância Sanitária (estadual e municipais)
e Núcleo de Repressão aos Crimes Contra a Saúde (Nucrisa), órgão da Polícia Civil).
O principal foco da campanha, contudo, está centrado no processo de conscientização que envolve não somente o profissional
médico e o farmacêutico, mas também a própria sociedade. Em 8 de maio último, o Conselho realizou em sua sede a Reunião Plenária
Temática sobre "Prescrição de Medicamentos Psicotrópicos", que serviu de ponto de partida para que todos os conselheiros,
diretores e delegados de Regionais se engajassem no movimento e fossem estimulados a propagar entre os colegas médicos, pacientes
e os meios de comunicação os efeitos decorrentes do uso de remédios para obesidade, que vão da dependência física e química
a danos à saúde, muitas vezes irreversíveis e que levam até à morte.
Desde a Reunião Temática, foram dezenas as atividades desenvolvidas em todo o Estado que tiveram correlação com a prescrição
e controle de substâncias anorexígenas e os próprios tratamentos relacionados à obesidade. Foram inúmeras reuniões de trabalho,
de entrevistas educativas e de alerta nos meios de comunicação e até mesmo ações fiscalizadoras e administrativas relacionadas
ao exercício ético da profissão, dentre as quais a que determinou a interdição cautelar - agora com o referendo da Justiça
Federal - do médico curitibano Antônio Pedro Paulo Nuevo Miguel, processado sob acusação de vender receitas de medicamentos
controlados. A repercussão da notícia vem como um componente a mais para desestimular excessos nos limites da profissão e
que incorrem em riscos à saúde pública.
O Conselho de Medicina a sua Câmara Técnica de Medicamentos, que já realizou uma série de reuniões para tratar sobre "Formulação
de Anorexígenos" e para avançar nos estudos para elaboração de uma cartilha educativa sobre o tema, que tende a compor a série
"Cadernos do Conselho" e será distribuído entre todos os médicos paranaenses. O grupo de trabalho tem a coordenação da conselheira
Mônica De Biase Wright Kastrup, presidente da Comissão de Divulgação de Assuntos Médicos do CRM (Codame). Estão integrados
à Câmara Técnica os Drs. Helvo Slomp Júnior, presidente da Associação Médica Homeopática do Paraná; Henrique de Lacerda Suplicy,
presidente da Associação Brasileira de Estudo sobre a Obesidade (OBESO); e Rosana Bento Radominski, presidente da Sociedade
Brasileira de Endocrinologia e Metabologia - Regional do Paraná. Dentre os colaboradores está Jackson Carlos Rapkiewicz, responsável
pelo Centro de Informações sobre Medicamentos do Conselho Regional de Farmácia.
A conselheira Mônica Kastrup, que tem representado o CRM na maioria das entrevistas e debates sobre prescrição de remédios
antiobesidade, diz que cabe aos profissionais de saúde cumprir a sua função ética para melhor esclarecer a sociedade e conscientizá-la
sobre os riscos e malefícios decorrentes da ingestão das "fórmulas magistrais" para emagrecimento. Neste aspecto, realça,
os médicos devem estar atentos aos critérios de utilização de drogas, sobretudo pelas associações impeditivas em normas do
Conselho Federal de Medicina e Anvisa. A presidente da Codame ressalta que a estratégia que vem sendo adotada visa possibilitar
aos médicos, independente de onde atuem, que tenham amplo acesso às informações concernentes às drogas anorexígenas, com ênfase
para prescrição e controle.
O presidente do Conselho, Hélcio Bertolozzi Soares, reforça a necessidade de esclarecimento na formulação de receituário
de remédio a ser manipulado, com o que recomenda aos médicos o controle periódico do paciente na vigência das receitas, o
uso criterioso de dosagens maiores e sempre com zelo para se restringir a casos específicos e, ainda, a fixação do tempo de
utilização das drogas. "Sabemos que há uma resposta não adequada no organismo ao longo tempo de uso e que essas substâncias
criam dependência física e psíquica", diz o presidente, sem deixar de advertir que o controle do receituário deve ser rigoroso,
tal qual a utilização deve ser avaliada através de consultas de controle. Além disso, cobra a transparência na relação médico-paciente
e registros claros nos prontuários.
Abordagem sobre legislação e abusos
Responsável pelo Centro de Informações sobre Medicamentos do CFM, Jackson Rapliewicz proferiu a palestra de abertura da
Reunião Temática sobre Prescrição de Medicamentos Psicotrópicos, na noite de 8 de maio. Com a Plenária Dr. Wadir Rúpollo (do
CRM) totalmente lotada, com a maioria dos conselheiros e diretores de regionais, o especialista chamou a atenção para a vigência
da Portaria 344/98 da Anvisa e seu anexo de farmacopia, onde é manifestada a proibição das associações de substâncias e traçados
os patamares limitadores de uso de doses diárias. Também advertiu sobre a prescrição ilícita de duas cápsulas ao mesmo tempo,
numa forma de burlar a proibição associativa de substâncias. Neste aspecto, o representante do CRF-PR lembrou que muitos produtos
são banidos pela literatura mundial, como o Fremporex, e que, nas dosagens, muitos profissionais brasileiros têm como referência
o Consenso Latino-Americano de Obesidade, que não é a literatura reconhecida pela Portaria 344.
O Dr. Jackson Rapkiewicz lamentou a posição do Brasil como "campeão mundial do consumo de aneroxígenos", tendo assinalado
que o fenômeno decorre do descumprimento das normas vigentes. Referindo-se à manipulação, disse que a RDC 33/2000, da Anvisa,
expressa que a prescrição precisa estabelecer a composição. Além disso, lembrou que a venda de produtos manipulados nas clínicas
é proibida, prevista somente quando da falta de produto no mercado. Mais adiante, referiu-se ao Decreto n.º 20.931/1932, que
veda ao médico a indicação de estabelecimentos farmacêuticos nas receitas médicas, com a colagem de selos de empresas que
fazem a venda das medicações por telefone, além de destacar outro grave problema: o uso contínuo dos magistrais.
O representante do CFM falou ainda sobre o uso do chamado carimbo redutor nas prescrições e da RDC 138/03, que trata da
prescrição pelo genérico. Também destacou o serviço gratuito mantido pelo CRF, de resposta às dúvidas dos profissionais de
saúde, tendo inclusive fornecido material de orientação útil aos médicos. A Dra. Sônia Aparecida Wagnitz Bertassoni, secretária
do Conselho de Farmácia e também presente ao encontro, esclareceu que o Paraná conta hoje com cerca de 10 mil farmacêuticos
e que o número de estabelecimentos é um pouco inferior.
Clínico adverte para a "venda de ilusões"
O Prof. Dr. João Gualberto de Sá Scheffer, clínico geral com mais de 52 anos de profissão e membro da Academia Paranaense
de Medicina, foi outro palestrante da Temática. Ele abordou o tema "Drogas aneroxígenas", as quais se referiu como "panecéias"
ou "ilusões". Citou obras publicadas há meio século e também um estudo recente de mais de 900 substâncias para respaldar sua
convicção de que, ao londo da história, os resultados tem sido praticamente inexistentes. "Os remédios são úteis, desde que
usados corretamente. Mas a verdade é que não curam nunca", decretou, defendendo a retirada de mercado da grande maioria e
que haja mais estudos de seus efeitos.
Na análise do Prof. João Gualberto, a obesidade deve ser entendida como uma doença crônica, que necessita de tratamento
a longo prazo, sendo criminosa a indução a resultados imediatos. Diz que os remédios podem agir como supressores a curto prazo,
auxiliando determinados tipos de pacientes, mas que prevalecem as conseqüências dos resultados imediatos, como os efeitos
colaterais e as dependências psíquicas e físicas. Para os pacientes, ele lamenta a comodidade e a falta de atividades físicas
que os impelem à busca aos tratamentos milagrosos. E critica: "Os médicos que utilizam as drogas não estudam a causa da obesidade
e se colocam num primeiro momento como um santo, um meio de esperança, mas logo depois se exibe a realidade, a que o profissional
se apresentou como um irresponsável".
Problemas mais comuns
Receitas ilegíveis
Receitas em código
Ausência de dose e posologia
Notificação não acompanhada de receita
Atenção
Resolução CFM 1.477/97
VEDA aos médicos a prescrição simultânea de drogas tipo anfetaminas, com um ou mais dos seguintes fármacos: benzodiazepínicos,
diuréticos, hormônios ou extratos hormonais e laxantes, com finalidade de tratamento da obesidade ou emagrecimento.
RECOMENDA aos médicos que, no tratamento da obesidade ou emagrecimento, restrinjam o uso de substâncias tipo anfetaminas,
como monodrogas, aos casos absolutamente indicados, seguindo rígidos critérios técnico-científicos.
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ler artigo publicado pela Cons. Raquele Rotta Burkiewicz, corregedora do CRM-PR.