19/07/2011
         Como some o dinheiro da saúde
         
         ANTONIO CARLOS LOPES*
            
Basta uma rápida busca na internet para confirmar que o caos da saúde é iminente e desenha-se ano após ano. As notícias
            de tempos atrás e as de hoje retratam uma tragédia anunciada pela insuficiência de recursos destinados à assistência dos cidadãos.
            
Veja só algumas manchetes através dos tempos: 2003, Brasil é o país que menos investe em saúde na América Latina; 2007,
            Investimento ainda é baixo em comparação com outros países; 2008, Brasil investe em saúde pouco mais que metade do gasto de
            países vizinhos; 2010, Saúde sofre com falta de recursos e gerenciamento precário; 2011, Brasil é lanterna em investimento
            na saúde.
            
Segundo o artigo 196 daConstituição Federal, "a saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas
            sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações
            e serviços para sua promoção, proteção e recuperação". Muito bonita a teoria, mas, para transformá-la em prática, são necessários
            recursos e vontade política.
            
O problema é que de boa parte dos gestores públicos, a quem caberiam comprometimento e responsabilidade social, nem sempre
            os exemplos são os melhores. Agora mesmo acabamos de confirmar denúncia há tempos feita por entidades médicas: há estados
            maquiando as destinações legalmente obrigatórias em saúde, desviando-as a outros fins. Nos últimos anos cerca de R$ 12 bilhões
            declarados como investimentos no setor foram gastos em saneamento básico, financiamento educacional, aposentadorias de servidores,
            só para citar alguns exemplos.
            
Claro que todos esses segmentos também são importantes, porém, todos têm destinações próprias. É inadmissível que sejam
            desviados os minguados recursos da saúde, sendo que nosso país padece de resolubilidade no atendimento, com hospitais sucateados,
            filas de esperas intermináveis, falta de leitos, recursos humanos desvalorizados e por aí vai.
            
Faz pouco tempo, a Organização Mundial da Saúde (OMS )divulgou relatório anual com dados sobre a saúde no mundo, entre
            eles os investimentos no setor por país. Entre as 192 nações avaliadas, ocupamos a medíocre 151º posição. Aqui, a parcela
            do orçamento reservada à saúde é de 6%. A média africana, região extremamente mais pobre e com incontáveis problemas sociais,
            é de 9,6%.
            
Em termos de financiamento, o Brasil está muito distante de países em que o acesso à saúde é, na prática, universal, integral,
            e direito de todos os cidadãos. No Reino Unido, 86% são de recursos públicos. Na Suécia, investe-se 85%. Na Dinamarca, Alemanha
            e França as destinações são, respectivamente, de 83%, 76% e 75%.
            
Não à toa, a despeito de ser considerado uma das propostas mais vanguardistas de universalização da assistência em todo
            o mundo, o Sistema Único de Saúde (SUS )ainda não se viabilizou. Sua inanição vem da falta de recursos.
            
Para reverter esse quadro, o remédio é conhecido: precisamos urgentemente regulamentar a Emenda 29, estabelecendo em lei
            os investimentos mínimos de Federação, estados e municípios, além de determinar o quesão defato as destinaçõespara asaúde.
            
Dinheiro investido em saúde não é gasto, e sim investimento. É o que precisamos: investimentos em dias melhores para os
            brasileiros.
            
*Antonio Carlos Lopes é presidente da Sociedade Brasileira de Clínica Médica.