Consentimento informado nas urgências e emergências

Thadeu Brenny Filho

Vamos primeiro às definições para melhor contextualizar o nosso artigo. Do Dicionário Aurélio, urgente (do latim, urgente) é adjetivo que significa “que urge”; “que é necessário ser feito com rapidez”. Ou ainda, indispensável, imprescindível. Ou iminente, impendente. Urgir (do latim, urgere), verbo intransitivo, decreta ser necessário, sem demora; ser urgente. Ou estar iminente; instar. Não permitir demora. Perseguir de perto; apertar o cerco. Tornar imediatamente necessário.

No que diz respeito à urgência, como qualidade de urgente, a definição aponta para dois critérios que conferem essa qualidade: o fator tempo (a rapidez) e o fator necessidade (precisa ser feito).

Emergência (do lat. emergentia), substantivo feminino, significa “ação de emergir”. Ou nascimento (do Sol). Ou situação crítica; acontecimento perigoso ou fortuito; incidente.

Em suma, trazido à luz da saúde, a emergência corresponde a um “processo com risco iminente de vida, diagnosticado e tratado nas primeiras horas após a sua constatação”. Exige que o tratamento seja imediato diante da necessidade de manter funções vitais e evitar incapacidade ou complicações graves. Representa situações como choque, parada cardíaca e respiratória, hemorragia, traumatismo cranioencefálico etc.

Urgência; por sua vez, significa “um processo agudo clínico ou cirúrgico, sem risco de vida iminente”. Nesse caso, há risco de evolução para complicações mais graves ou mesmo fatais. Porém, não existe um risco iminente de vida. Representa situações como fraturas, feridas lácero-contusas sem grandes hemorragias, asma brônquica, transtornos psiquiátricos etc.

Os casos que exigem uma cirurgia de urgência podem ser operados entre 6 e 24 horas, aproximadamente, a partir do diagnóstico. Ou seja, o procedimento cirúrgico deve ser realizado em até um dia. Caso contrário, a situação pode se agravar e causar problemas maiores para o paciente.

Alguns exemplos de cirurgias de urgência são a retirada de um apêndice inflamado e casos de fratura, luxação ou torção. Ou seja, a operação não precisa ser imediata, porém, deve acontecer em um curto prazo.

Já a cirurgia de emergência é aquela em que o atendimento deve ser imediato, uma vez que há risco de vida, perda de membro ou lesão permanente. Entre os três tipos de cirurgias (eletiva, de urgência ou de emergência), ela é a mais urgente.

Se uma cirurgia de urgência deve ser feita entre 6 e 24 horas, aproximadamente, a cirurgia de emergência deve ser feita em até 6 horas depois do diagnóstico, pois cada minuto conta. Por essa razão, a palavra escrita nas ambulâncias é “emergência“, e não “urgência”, já que o atendimento deve ser imediato.

Há variações apontadas em diversas situações, como da urgência relativa ou da urgência eletiva, propalada em cirurgias realizadas aos arrepios das resoluções estaduais que proibiram as cirurgias eletivas.

Quais são elas?

A Nota Técnica GVIMS/GGTES/ANVISA n° 06/2020) dá o rumo à classificação das cirurgias:

- Emergência: devem ser realizadas em até 1 hora;

- Urgência: devem ser realizadas em até 24 horas;

- Urgência eletiva: devem ser realizadas dentro de duas semanas;

- Eletiva essencial: devem ser realizadas entre 3 e 8 semanas.

Tenho a apontar o questionamento de colega anestesiologista, em plantão de pronto-socorro de alta demanda, sobre a necessidade de formar consentimento informado e esclarecido em pacientes ali internados em grave situação clínica/cirúrgica. Como obter o consentimento? É obrigatório? É norma regulamentar?

A Resolução CFM nº 1451/1995 define o mérito, o labor dos serviços de prontos-socorros e congêneres:

Artigo 1º - Os estabelecimentos de Prontos-Socorros Públicos e Privados deverão ser estruturados para prestar atendimento a situações de urgência-emergência, devendo garantir todas as manobras de sustentação da vida e com condições de dar continuidade à assistência no local ou em outro nível de atendimento referenciado.

Parágrafo Primeiro. Define-se por URGÊNCIA a ocorrência imprevista de agravo à saúde com ou sem risco potencial de vida, cujo portador necessita de assistência médica imediata.

Parágrafo Segundo. Define-se por EMERGÊNCIA a constatação médica de condições de agravo à saúde que impliquem em risco iminente de vida ou sofrimento intenso, exigindo, portanto, tratamento médico imediato.

Na questão do consentimento informado, vamos ao Código de Ética Médica, que indica ser vedado ao médico:

“Deixar de obter consentimento do paciente ou de seu representante legal após esclarecê-lo sobre o procedimento a ser realizado, salvo em caso de risco iminente de morte” (art. 22) edeixar de garantir ao paciente o exercício do direito de decidir livremente sobre sua pessoa ou seu bem-estar, bem como exercer sua autoridade para limitá-lo (art. 24).

Logo, há amplo espaço para se obter o necessário e ético documento do consentimento informado nessas situações, fora o risco iminente de morte.

Mas, pergunta-me o anestesista do dia, escalado para os consentimentos informados: como obtê-lo de quem não pode assinar, pois está com imobilização gessada em sua mão? Ou inconsciente e sem acompanhante no seu leito? Ou uma rafia vascular salvadora de membro inferior ou superior tentando evitar uma amputação primária, questiona o cirurgião-vascular?

Bem esclarecido acima, salvo risco iminente de morte, deve-se obter de alguma forma este documento. E de alguma forma, sempre que possível, conversar claramente com o enfermo ou acompanhante (e deste obter a assinatura). Ou, se desacompanhado ou se em estado de lucidez comprometido, não vígil, o médico deve fazer constar ao documento formal que viu o paciente ser operado e formalizar isso no prontuário médico-hospitalar (embora o termo de consentimento faça parte deste).

Finalizando, sem esgotar-se o assunto, em casos de emergência ou urgências, o termo de consentimento esclarecido e informado é dispensável? Não!

E, no caso iminente de morte ‑ e é o que se entende por tal fato concreto ‑, é a única forma permitida, não se excluindo do depois (se intervenções médicas consecutivas) obter a necessária autorização do paciente e/ou seus familiares e em respeito à sua autonomia.

Assim, em tese, todo procedimento profissional necessita de uma autorização prévia. Isso atende ao princípio da autonomia ou da liberdade pelo qual todo indivíduo tem por consagrado o direito de ser autor do seu próprio destino e de optar pelo caminho que quer dar a sua vida.

Desse modo, a ausência desse requisito pode caracterizar infrações aos ditames da Ética Médica, a não ser em delicadas situações confirmadas por iminente perigo à vida. Registre-se, ainda, que o primeiro consentimento (consentimento primário) não exclui a necessidade de consentimentos secundários ou continuados. Desse modo, por exemplo, um paciente que permite seu internamento num hospital não está, com isso, autorizando o uso de qualquer meio de tratamento ou de qualquer conduta.

O consentimento presumido é discutível. Se o paciente não pode falar por si ou é incapaz de entender o ato que se vai executar, estará o médico obrigado a conseguir o consentimento de seus responsáveis legais (consentimento substituto, já delineado linhas acima). Deverá saber, também, o que é representante legal, pois nem toda espécie de parentesco qualifica um indivíduo como tal.

*Thadeu Brenny Filho é conselheiro do CRM-PR e membro da Codame – Comissão de Divulgação de Assuntos Médicos.

**As opiniões emitidas nos artigos desta seção são de inteira responsabilidade de seus autores e não expressam, necessariamente, o entendimento do CRM-PR.

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