Dia Mundial do Câncer: qual o significado?

Guilherme Augusto Murta

A União Internacional para o Controle do Câncer (UICC), com o apoio da Organização Mundial da Saúde (OMS), estabeleceu o dia 4 de fevereiro como Dia Mundial de Combate ao Câncer, data emblemática para ressaltar a conscientização e estímulo a práticas que possibilitem atitudes preventivas. O câncer é uma pauta extremamente importante referente à saúde populacional mundial, sendo a segunda maior causa de mortes, totalizando mais de 10 milhões de óbitos por ano. Estima-se que 40% destas estão ligadas a fatores de riscos modificáveis como tabagismo, sedentarismo, alimentação inadequada e abuso de álcool. Além disso, cerca de 1/3 dos casos em que o desfecho é a morte poderiam ser precocemente rastreados por exames preventivos e tratamento mais efetivo com elevação de chance de sobrevida.  

Financeiramente também há impactos relevantes, com um custo anual no mundo estimado em 1,16 trilhões de dólares. Para se ter ideia, isso é equivalente a mais que 50% da soma de todos os bens e serviços finais produzidos (PIB) no Brasil em 2021. Quanto mais tardiamente for identificada a doença, a tendência é que o tratamento seja menos efetivo (menor chance de sobrevida) e com custo mais expressivo. Seja do ponto de vista do sofrimento humano dos doentes, recursos utilizados em insumo de cuidados à saúde ou custos financeiros envolvidos sobram motivos para estimular hábitos saudáveis e exames para rastreamento precoce. Em empresas que disponibilizam aos colaboradores planos de saúde, a sinistralidade frente a neoplasias figura entre as causas mais dispendiosas e consiste em custos financeiros relevantes para as companhias.  

Em relação a incidência de cânceres no Brasil, de acordo com o INCA, em 2022 as localizações mais frequentes em homens foram: próstata (30%), cólon e reto (9,2%), traqueia, brônquios e pulmão (7,5%) e estômago (5,6%). E em mulheres: mama (30,1%), cólon e reto (9,7%), colo de útero (7%) e traqueia, brônquios e pulmão (7,5%). Por outro lado, a maior mortalidade em homens foi o de traqueia, brônquios e pulmões (13,6%) seguido por próstata (13,5%), cólon e reto (8,4%) e estomago (7,5%) e em mulheres mama (16,5%), traqueia, brônquios e pulmão (11,6%), cólon e reto (9,6%), colo de útero (6,1%).  

A origem de muitas destas patologias está ligada à presença de fatores de risco. De forma geral, evitar hábitos que aumentem risco de câncer (como fumar, ingerir regularmente bebidas alcoólicas, consumir alimentos ultraprocessados, obesidade) e adotar um modo de vida saudável (alimentos de origem vegetal, atividades físicas, evitar exposição solar entre às 10 e 16 horas) fazem parte de estratégias de prevenção primária, impedindo o aparecimento da neoplasia. Para reduzir a chance do desenvolvimento de câncer de colo de útero há disponível ainda, inclusive pelo SUS, a vacinação contra o vírus HPV, indicada para meninas dos 9 aos 14 anos e meninos de 11 a 14 anos (para redução de contágio). Um fator protetivo especificamente contra o câncer de mama é o aleitamento materno, que deve ser estimulado de maneira exclusiva até os seis meses do bebê, sendo benéfico simultaneamente para a criança e a mãe. 

Em relação ao rastreamento para diagnóstico precoce em população sem sintomas (screening), existem disponíveis exames para rastreamento dos cânceres de maior incidência, como: câncer de colo de útero com o exame preventivo (Papanicolau); câncer de mama com a mamografia; câncer de cólon e reto com o sangue oculto nas fezes ou colonoscopia. Quando screening tem alguma alteração ou caso o quadro clínico justifique, outros exames podem ser solicitados a critério médico, para diagnóstico individualizado, como uma biópsia quando há uma lesão em colo de útero. Cabe ressaltar que, após o resultado do exame, é indispensável uma avaliação médica para indicar a conduta mais apropriada para cada situação.  

O ambiente de trabalho também é um local em que há oportunidade para prevenção de câncer, já que alguns agentes de risco que podem estar presentes nos processos produtivos são classificados como cancerígenos.  No entanto, estima-se que apenas 2 a 4% dos casos de câncer podem guardar correlação ocupacional. Estão descritos alguns produtos na Lista Nacional de Agentes Cancerígenos para Humanos (LINACH), especialmente os classificados como grupo 1 (confirmados como cancerígenos para humanos como amianto) e 2A (provavelmente cancerígenos para humanos, como chumbo inorgânico), que preferencialmente devem ser eliminados ou substituídos e, se não for possível, busca-se impedir o contato nocivo com os trabalhadores e monitoramento sobre a exposição com forma de buscar proteger a saúde.

Os fatores que influenciam na possibilidade de desenvolvimento de câncer ocupacional frente à exposição a agente cancerígeno são diversos, como: a dose diária absorvida, tempo de exposição e fatores individuais (como suscetibilidade, fatores de risco e proteção). Para identificação destes aspectos é altamente recomendável que profissionais de engenharia de segurança e medicina do trabalho competentes sejam envolvidos na elaboração dos programas legais obrigatórios, como o Programa de Gerenciamento de Riscos (PGR) e Programa de Controle Médico de Saúde Ocupacional (PCMSO). Nestes, há identificação de agentes de risco pela equipe da engenharia de segurança, bem como a indicação de planos de ação para medidas mitigatórias (PGR) e indicação de monitoramento da saúde dos trabalhadores pelo médico do trabalho (PCMSO).  

Assim, o Dia Mundial do Câncer é uma oportunidade de enfatizar a relevância sobre este tema, que guarda profundas repercussões no bem-estar individual, na saúde populacional e em sustentabilidade financeira de sistemas de saúde. A prevenção do câncer está ligada a aspectos individuais quanto ao estilo de vida (fatores de risco e proteção), mas também abrange estratégias de saúde coletiva para o acesso adequado aos serviços de saúde (exames, consultas), assim como ações em higiene ocupacional para avaliação de riscos e monitoramento de saúde do trabalhador. São diversos atores e sistemas de interface que serão mais efetivos ao atuarem sinergicamente em busca de evitar o câncer. E, se houver a doença, atuar no diagnóstico precoce para tratamento com objetivo curativo. É preciso união de esforços, juntos contra o câncer! 

*Guilherme Augusto Murta (CRM-PR 24.287) é especialista em Medicina do Trabalho (RQE 2.727). Médico do trabalho do SESI-PR, mestre em ensino de Ciências da Saúde, professor de especialização em Medicina do Trabalho da UFPR, membro da Comissão de Saúde Suplementar do CFM e ex-presidente da Associação Paranaense de Medicina do Trabalho (APAMT).

**As opiniões emitidas nos artigos desta seção são de inteira responsabilidade de seus autores e não expressam, necessariamente, o entendimento do CRM-PR.

Fontes:

Instituto Nacional de Câncer (INCA), disponível em https://www.inca.gov.br/campanhas/dia-mundial-do-cancer ; https://www.gov.br/inca/pt-br/assuntos/cancer/numeros ; https://www.gov.br/inca/pt-br/assuntos/cancer/tipos/pulmao ; https://www.gov.br/inca/pt-br/assuntos/causas-e-prevencao-do-cancer/como-prevenir-o-cancer   Acesso em 23/01/23.  

Internacional para o Controle do Câncer (ICC) , disponível em https://www.worldcancerday.org/our-story#:~:text=Origins%20of%20World%20Cancer%20Day,the%20New%20Millennium%20in%20Paris ; https://www.worldcancerday.org/what-cancer . Acesso em 23/01/23 

Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística(IBGE) Disponível em https://www.ibge.gov.br/explica/pib.php Acesso em 23/01/23 

US Preventive Services Task Force Disponível em https://www.uspreventiveservicestaskforce.org/uspstf/topic_search_results?topic_status=P&grades%5B%5D=A&searchterm= Acesso em 23/01/2023 

Biblioteca Virtual em Saúde – Ministério da Saúde. Disponível em https://bvsms.saude.gov.br/cancer-ocupacional/ Acesso em 23/01/2023.

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