ENSINO MÉDICO: decisões inusitadas

Prof. Dr. Antonio Celso Nunes Nassif



"Uma coisa não é justa porque é lei, mas deve ser lei porque é justa". (Montesquieu)




O ensino médico nestes últimos meses vem passando por situações inusitadas. Parece que não foi o bastante a criação de 65 novos cursos de medicina somente neste início de século. Querem mais e de qualquer forma. Vamos analisar três delas.

1 - No início deste ano a Uningá, em Maringá/PR criou à revelia do MEC seu curso de medicina lastreado em uma liminar do Poder Judiciário. Fato inédito no âmbito do ensino médico, sendo a única IES a ter um curso de medicina autorizado pela Justiça. O vestibular foi realizado, 100 alunos foram matriculados e o curso iniciado. O MEC recorreu e conseguiu derrubar a liminar, tornando assim sem efeito o referido curso. A instituição reiterou o pedido inicial de antecipação de tutela e teve decisão favorável. A União recorreu ao STJ alegando efeito multiplicador por motivar outras instituições de ensino a ajuizar demandas com o mesmo objetivo. Há poucos dias saiu a sentença. Eis o teor. "A Unidade de Ensino Superior Ingá (Uningá), de Maringá (PR), pode oferecer o curso de medicina até que o MEC analise se a instituição atende aos requisitos necessários para seu funcionamento. A decisão é do Superior Tribunal de Justiça. O ministro Raphael de Barros Monteiro Filho negou pedido de suspensão de segurança da União. Ele entende que não estão presentes os pressupostos específicos para a concessão. Para o ministro Barros Monteiro, a concessão é medida excepcional e sua análise deve se restringir à verificação da lesão aos bens jurídicos, quais seja a ordem, a saúde, a segurança e a economia pública. Segundo o ministro, nos argumentos apresentados pela União, não se vislumbra risco de dano à ordem ou à saúde que justifique a concessão da medida extrema da suspensão de liminar."

Entendemos que faltou ao ilustre ministro do STJ analisar um simples detalhe: a inafastável garantia da qualidade do ensino aos acadêmicos matriculados. Será que a "lesão aos bens jurídicos" citados é mais significativa que eventuais danos ocasionados à saúde dos pacientes por despreparo, imperícia ou negligência do profissional médico que não teve um ensino sério e adequado?

2 - Recentemente, o governo do presidente Lula conseguiu "resolver" o problema dos brasileiros que estudam medicina em Cuba. Vejam como foi: "Depois de oito meses de discussões, o governo brasileiro conseguiu a primeira vitória para aprovação no Congresso do acordo que torna automática a validação de diplomas de brasileiros formados na Escola Latino Americana, ELAM, em Cuba. A confirmação do acordo oferece duas vantagens para estudantes brasileiros de Medicina que estudam naquele país. Profissionais que já completaram o curso podem complementar o currículo no Brasil, em universidades públicas e depois se submeter a uma prova. Além disso, o acordo prevê a realização de convênios para que professores brasileiros sejam enviados à escola, onde duas disciplinas poderiam ser dadas especialmente para brasileiros: doenças tropicais e sobre o funcionamento do SUS. Para alunos formados com esse novo currículo, a validação do diploma seria automática".

3 - Finalmente, há poucos dias esse mesmo governo criou o Programa de Apoio a Planos e Reestruturação e Expansão das Universidades Federais - REUNI instituído pelo Decreto n. 6096/07 e foi divulgado com o propósito de "dobrar" os alunos das universidades públicas. A quantidade de professores será a mesma. Cada sala de aula que só podia ter no máximo 50 alunos passará para 150. As universidades que aderirem ao REUNI receberão 20% a mais de recursos, mas para isso, terão que garantir um mínimo de 20% de novas vagas. Ainda mais, 90% dos alunos matriculados terão que concluir o curso, o que significa, na prática, a adoção de aprovação automática. As que não aderirem serão "condenadas" ao congelamento orçamentário. Hoje, as Universidades Federais oferecem 4.436 vagas anualmente para o primeiro ano do curso. Na melhor das hipóteses, 20% representariam 887 novas vagas, equivalendo a dez escolas médicas "novíssimas" com 88 vagas.

O que nos espera no futuro? Lamentável!


* Doutor em Medicina, foi presidente da Associação Médica Brasileira - e.mail acnnassif@netpar.com.br

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