"Erro" que custa caro

A incúria dos governos em tomar as efetivas e necessárias medidas para garantir à população um atendimento em saúde de qualidade prejudica não só os pacientes, mas também os próprios médicos



O governo recuou no propósito de alterar a sistemática de remuneração dos médicos do serviço público federal, conforme o previsto na Medida Provisória n.º 568, que tramitava no Congresso. Na segunda-feira, a ministra das Relações Institucionais, Ideli Salvatti, apressou-se em comunicar que teria ocorrido "um erro" na edição da MP e que será feita a correção no texto. Segundo os médicos que se mobilizaram em todo o país para derrubar a matéria, as alterações provocariam um corte que chegaria à metade dos vencimentos recebidos; o que atualmente é pago por 20 horas, alertaram as entidades médicas, passaria a ser o valor da jornada de 40 horas.


A alteração agora anunciada prevê a colocação dos profissionais médicos em uma tabela remuneratória específica e com a garantia da manutenção dos benefícios atualmente percebidos. Menos mal que o equívoco venha a ser corrigido a tempo, conforme informou a ministra; no entanto, cabem aqui algumas considerações em torno do imbróglio. Começando pela simplória explicação de Ideli de que houve "um erro" quando da edição da MP. Simples assim, como se a falha dissesse respeito a assunto de pouca importância e passível de correção a qualquer tempo e sem consequências maiores.


Não é de hoje que a saúde pública no Brasil não é tratada com a atenção e a seriedade que merece. Hospitais lotados, déficit de leitos nas UTIs, falta de profissionais especializados e de equipamentos, esperas que se estendem por meses para uma simples consulta expõem com clareza a realidade do setor. Uma situação que, na verdade, não é nova, mas provocada pela incúria dos sucessivos governos em tomar as efetivas e necessárias medidas para garantir à população um atendimento em saúde de qualidade. Por tudo isso, acabam penalizados diretamente não apenas os pacientes, pelas dificuldades de acesso aos serviços de saúde, mas também os próprios médicos, que não conseguem dar vazão à crescente demanda por atendimento.


Já se comentou neste mesmo espaço que os investimentos em saúde no Brasil ficam aquém das necessidades e mesmo determinações legais para os repasses muitas vezes deixam de ser cumpridas. Em 2010, os recursos aplicados pelo país no setor chegaram a 4% do PIB, o que corresponde a cerca de R$ 127 bilhões. Ainda que possa representar uma soma considerável, na avaliação de especialistas seria necessário um aporte de mais R$ 83 bilhões para resgatar a dívida com a saúde dos brasileiros.


Enfim, a mobilização dos médicos lotados no serviço público federal tende a refluir com a recuo do governo em relação à MP 568, mas a situação da saúde pública no Brasil continua longe de uma solução. É urgente um choque de gestão que permita superar os gargalos existentes, a começar pela recuperação da credibilidade do Sistema Único de Saúde. Implantado em 1988, o SUS surgiu com a expectativa de garantir atendimento médico de qualidade aos brasileiros. Se em parte cumpre com sua finalidade, poderia fazer muito mais - desde que recebesse do governo a atenção devida ao seu pleno funcionamento. Com isso, fatos desagradáveis como movimentos grevistas, falta de leitos e médicos poderiam ser definitivamente superados.



Editorial publicado no jornal href="http://www.gazetadopovo.com.br/opiniao/conteudo.phtml?tl=1&id=1265100&tit=Erro-que-custa-caro" target="_blank">Gazeta do Povo em 14/06/2012.

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