05/11/2007

Médico receita em troca de presente

Relatório internacional mostra que laboratórios farmacêuticos oferecem de tudo a profissionais do 3.º Mundo
As multinacionais do setor de medicamentos vêm cortejando médicos de países em desenvolvimento, com presentes que vão desde jantares a presentes generosos, como aparelhos de ar condicionado, máquinas de lavar roupa e pagamento da entrada na compra de carro. São incentivos para que eles prescrevam seus remédios, revelou um relatório divulgado na quarta-feira.

Segundo o estudo da Consumers International (CI), a auto-regulamentação das gigantes multinacionais farmacêuticas falhou. O relatório cita, por exemplo, anúncios de remédios de empresas como GlaxoSmithKline, Wyeth, Novartis e Pfizer, que foram considerados enganosos na Europa, e também a intensa promoção de seus produtos junto a médicos.
O impacto sobre os pacientes é sério, diz o estudo: "Até 50% dos remédios nos países em desenvolvimento são prescritos, administrados ou vendidos inadequadamente."
Os presentes oferecidos pelas empresas a médicos incluem aparelhos de ar condicionado, laptops, pagamento para se associar a um clube, conferências no exterior com hospedagem em hotéis cinco estrelas, carros novos, pagamento de matrículas nas escolas. No Reino Unido, só são permitidos presentes de pequeno valor, como canetas.
Murad M. Khan, professor e presidente do Departamento de Psiquiatria da Universidade Aga Kahn, disse aos pesquisadores que, no Paquistão, "por 200 receitas de um medicamento caro de uma companhia, um médico pode ser recompensado com o pagamento da entrada de um novo carro de marca".

A CI no Paquistão fez um levantamento entre médicos, representantes de vendas e pessoal de lojas de produtos médicos. Um médico indiano disse aos pesquisadores que o recebimento de "presentes de aparelhos de ar condicionado, máquinas de lavar roupa, fornos de microondas, câmeras, televisores e cristais caros hoje é uma norma aceita". Como também "agrados na forma de reuniões sobre educação médica continuada e conferências em hotéis de várias estrelas acompanhados de jantares e coquetéis generosos". Informes similares vieram da Venezuela, Indonésia e Malásia.

Richard Lloyd, diretor-geral da CI, federação de grupos de consumidores de 113 países, com sede em Londres, pediu a proibição de qualquer premiação a médicos. "A indústria farmacêutica vê o mundo em desenvolvimento como uma oportunidade de trilhões de dólares para garantirem os lucros nos próximos 40 anos", disse. "Regulamentos frágeis tornam esses mercados um alvo fácil para as técnicas de marketing das multinacionais farmacêuticas, mas os gastos do consumidor com a saúde nesses países não permitem que ele desperdice seu dinheiro usando remédios irracionalmente."

Efeitos colaterais

O relatório critica também as propagandas de remédios em países em desenvolvimento que, segundo o estudo, às vezes promovem o medicamento sem mencionar seus efeitos colaterais ou as restrições ao seu uso - por exemplo, se é eficaz só para mulheres e não para homens.

As autoridades reguladoras nesses países são lentas na proteção das pessoas, no caso de remédios proibidos ou retirados do mercado em outros países. O Vioxx foi oficialmente proibido na Índia em outubro de 2004, um mês depois de ser retirado do mercado nos Estados Unidos pela Merck, mas um ano depois a droga ainda era vendida na Índia.

A Federação Internacional das Associações de Fabricantes Farmacêuticos (IFPMA, na sigla em inglês) disse que levará tempo para seu código de conduta ser adotado em todas as partes. "Acho que não é algo que se pode conseguir da noite para o dia", disse o porta-voz Guy Willis. "O problema é como chegar lá." Ele pediu à CI que relacionasse as empresas para as quais há evidências de violação do código de conduta da IFPMA.


Fonte: O Estado de São Paulo

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