Não será preciso importar médicos. Os médicos irão para o interior por opção

João Hélio Rocha

A solução é a motivação: o PNS gerou subsídios de alto valor sociológico e econômico que induziram à migração de médicos para o interior e periferias.

Conheça no pequeno texto abaixo as bases desta migração ocorrida num plano experimental que poderá se repetir em grande escala

As deficiências do ensino médico afetam a qualidade da assistência médica e contribuem para elevar seus custos. Num trabalho nosso “O ensino médico e a distribuição de médicos no Brasil”, aqui resumido, discorremos sobre a reforma do ensino médico na América do Norte para que se possa meditar sobre as pretendidas medidas do governo brasileiro de criar um grande número de novas faculdades de medicina e ampliar do curso de formação para 8 anos sem ter professores disponíveis e didaticamente preparados, e nem contar com estabelecimentos de saúde equipados para treinamento dos alunos.

Há um paralelismo entre a situação do ensino médico na América do Norte em 1910 com a atual do Brasil. Havia em 1910 nos Estados Unidos e no Canadá, (então um domínio britânico, até 1931) 160 escolas médicas. Com base no Relatório Flexner, elaborado de 1906 a 1910, foram fechadas 94 escolas médicas no período 1910 a 1933, todas de baixa qualidade de ensino, mal equipadas e com deficiências qualitativas e quantitativas no corpo docente e que graduavam um número excessivo de profissionais. Para as remanescentes foram estipuladas normas de funcionamento com obrigatoriedade de serem vinculadas a uma universidade ou a hospitais de ensino previamente qualificados. Foi também estabelecido um processo de aferição da capacidade técnica do aluno após a graduação, conhecido pela designação “State Board”. A licença para a prática médica passou a ser concedida somente após a aprovação no exame de suficiência.

A partir de 1933, os Estados Unidos (então com 125 milhões de habitantes e o Canadá, 10,5 milhões) passaram a ter apenas 66 faculdades de medicina, todas confiáveis e que formavam médicos habilitados para atender para as necessidades de saúde dos norteamericanos. Com esta reforma, a medicina americana deu o salto para a qualidade internacionalmente reconhecida. Nota-se que o ensino médico do Brasil está na contramão da História. Enquanto os norteamericanos se pautam pela qualificação dos seus médicos o governo brasileiro quer estabelecer uma agenda de quantificação de médicos, ficando a qualidade em segundo plano.

As medidas de ampliação do curso médico, a multiplicação intempestiva de faculdades de medicina, a importação de médicos estrangeiros e a arregimentação de médicos recemformados para prestar assistência médica nas cidades pequenas e na periferia dos grandes centros sem médico constitui uma medida temerária por faltar uma estrutura assistencial e de assessoramento adequada para o aprimoramento dos profissionais em início de carreira. O aproveitamento pelo SUS dos bons resultados deixados pelo Plano Nacional de Saúde experimentado nas microrregiões de Nova Friburgo, Barbacena e Mossoró (14/12/1968 a 9/01/1971), entre eles o que induziu a migração voluntária — totalmente espontânea — de 15 médicos para onze cidades pequenas sem médicos, repetirá em grande escala a migração voluntária de profissionais motivados. Este texto faz parte do nosso recente livro “Fortalecimento do SUS com a participação popular”.

Artigo escrito por João Hélio Rocha, médico há 50 anos em Nova Friburgo e pesquisador em saúde desde 1969, ex-diretor de hospital, fundador e presidente de Nova Friburgo durante dez anos, depoente sobre o PNS na Câmara dos Deputados.

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