Para fazer boa medicina no Brasil

Roberto Luiz d'Avila

As entidades médicas reconhecem a importância de estender atendimento de qualidade às populações dos pequenos municípios e das periferias dos grandes centros. Mas como resolver isso?

Para o governo, a solução se resume na presença de um médico num posto de saúde. Esse entendimento assume proporção ainda mais grave quando ele propõe importar médicos estrangeiros sem revalidação de títulos para ocupar os espaços nos rincões do país. Ao trilhar esse caminho, o governo fere as normas legais, desvaloriza os profissionais nacionais e, sobretudo, coloca a vida de milhões de brasileiros em situação de risco.

Argumenta-se que onde há carência total de profissionais, “alguém” com um mínimo de conhecimento faz a diferença. O problema é que esse alguém – na tentativa de fazer a coisa certa – pode diagnosticar errado, prescrever de forma inadequada, retardar tratamentos e induzir a práticas errôneas.

Candidatos ao exercício da medicina em território brasileiro devem ter seu conhecimento avaliado de forma criteriosa. E o governo já tem instrumento para isso: o Exame Nacional de Revalidação de Diplomas Médicos (Revalida), criado por ele mesmo, em 2010.

Ora, o Brasil é um país de imigrantes, e o CFM jamais seria contra a vinda de médicos estrangeiros, como nunca foi e não é. No entanto, não pode abrir de suas prerrogativas de exigir e defender a boa prática médica no país. Que venham seis mil ou mais. No entanto, que todos sejam aprovados em exames justos, sem concessões.

Certamente, a crise assistencial é urgente e, portanto, exige medidas igualmente urgentes. Inclusive, as entidades estão dispostas a negociar termos para que o trabalho do médico se realize nesses locais, mas tendo como pressuposto a transitoriedade dessas alternativas. Há poucos dias, o Conselho Federal de Medicina (CFM) entregou ao Palácio do Planalto um plano de ação, com o qual podemos vislumbrar soluções para os impasses identificados.

A principal proposta – de efeito imediato – foca na oferta da oportunidade e estímulo aos médicos formados no Brasil para ocupação dos postos de trabalho existentes nas áreas de difícil provimento. Esse seria o âmago do Programa Nacional de Interiorização da Medicina, que supriria a carência, especialmente, dos municípios sem médicos ou com populações de até 50 mil habitantes.

Muito se fala da resistência do médico a se instalar nos vazios assistenciais. Não é verdade. Se houver oportunidades sólidas, com todo o aparato necessário para que o trabalho se realize, milhares se apresentarão. Enquanto vigorar essa alternativa temporária , o governo teria tempo para construir e implementar carreira federal de Estado para o médico do Sistema Único de Saúde (SUS), essa sim, uma resposta definitiva para a fixação dos profissionais nas áreas de difícil provimento.

Onde há condições de trabalho existem médicos, onde não há essas condições, não existem médicos. Ressaltamos mais uma vez nossa incompreensão da tese de que a simples alocação do médico em um determinado município tornará a população assistida. Para que esse benefício seja oferecido com efetividade e eficácia, é necessário interiorizar o sistema de saúde, no qual o médico é um integrante importante, mas não suficiente para que os resultados ocorram.

Certamente, essa aposta implica em maior investimento em saúde, com alocação de recursos na proporção necessária à demanda para bem assistir a população. Diante de tamanho desafio, os conselhos de medicina querem colaborar com esse processo de forma ativa e estão abertos ao diálogo para dotar o país de médicos competentes, comprometidos, bem preparados e estimulados a cumprir sua missão de levar o bem-estar e salvar vidas.

Artigo escrito por Roberto Luiz d'Avila, Cardiologista, presidente do Conselho Federal de Medicina (CFM).

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