Quer se anunciar médico especialista? Só com RQE!

Thadeu Brenny Filho

O estudo Demografia Médica 2018, que traz dados sobre o número e a distribuição de profissionais no Brasil, mostrou que houve um crescimento grande da população médica num período tão curto de tempo. Em menos de cinco décadas, o total de médicos aumentou num ritmo três vezes maior do que o índice populacional geral. No entanto, esse salto não trouxe os benefícios que a sociedade espera.

A pesquisa expõe a grande concentração de profissionais nas regiões mais desenvolvidas, nas capitais e no litoral. O Sudeste, por exemplo, é a região com maior razão de médicos por 1.000 habitantes. Atinge 2,81, contra 1,16 no Norte e 1,41 no Nordeste.

Somente o estado de São Paulo concentra 21,7% da população e 28% do total de médicos do País. Por sua vez, o Distrito Federal tem a razão mais alta, com 4,35 médicos por mil habitantes, seguido pelo Rio de Janeiro, com 3,55. Do total de médicos em atividade no País, 62,5% têm um ou mais títulos de especialista. Por outro lado, 37,5% não têm título algum. São 282.298 especialistas e 169.479 generalistas (médicos sem título de especialista).

A razão é de 1,67 especialista para cada generalista. O dado, presente como uma das conclusões da Demografia Médica 2018, permite afirmar que o número de especialistas vem crescendo no Brasil, sobretudo em função da expansão de programas e vagas de residência médica.

A pesquisa considera apenas os dois caminhos oficiais que levam o médico a ser reconhecido como especialista no Brasil: a conclusão de programa de residência médica e a obtenção de título via Sociedade de Especialidade Médica.

O estudo adotou o termo “generalista” para designar o médico sem título de especialista. Mas é de se considerar que médico “clínico geral” não deve assim se autodenominar, pois Clínica Médica é especialidade reconhecida e inserida na Resolução CFM 2221/2018, que normatiza as especialidades e área de atuação da Medicina no Brasil.

O mesmo estudo, publicado em fins de março de 2018, atesta que, juntas, quatro especialidades representam nada menos do que 38,4% de todos os títulos de especialistas no País. São elas: Clínica Médica, que tem 42.728 titulados, ou 11,2% do total; Pediatria, com 39.234 titulados (10,3%); Cirurgia Geral, que reúne 34.065 especialistas (8,9%); e Ginecologia e Obstetrícia, que tem 8% dos titulados, ou seja: 30.415.

O uso crescente do aparato científico e tecnológico tem influenciado intensamente no processo de especialização, no mundo como um todo, proporcionando uma maior expectativa de vida e trazendo, consequentemente, sérias implicações nos custos de assistência médico-hospitalar. Desta forma, o alto custo do modelo da medicina atual, “superespecializada”, é cada vez mais questionado tanto em relação ao seu poder de resolubilidade quanto à sua eficácia frente aos contrastes sociais e regionais.

Reconhece-se no setor saúde a especialização precoce dos recém-formados, exigida pelo próprio mercado de trabalho, que se orienta para o uso direto da tecnologia, contrastando com a enorme parcela de milhões de brasileiros que sequer têm acesso aos serviços básicos de saúde. A própria categoria não consegue dar conta de reverter esta situação, tornando-se o médico, cada vez mais, operador de máquinas, tal qual uma linha de produção industrial.

Para Médici (1987), a especialização foi um mecanismo criado para permitir a expansão mercado de trabalho médico e assegurar o status quo da categoria. No entanto, ainda segundo este autor, a especialização pode ser encarada como uma situação de complementaridade e dependência entre os profissionais, como uma forma de preservar os nichos profissionais e, consequentemente, a autonomia profissional. O médico, que detinha conhecimento do indivíduo como um todo, passou a dividi-lo com outros profissionais, tratando apenas de parte específica, reduzindo a sua noção de totalidade, tanto do objeto de seu trabalho, o paciente, quanto do produto de seu trabalho, afastando-se da relação direta com o mesmo.

Ao término da faculdade, o médico encontra um desafio ainda maior: conseguir a tão sonhada vaga de residência médica. E esse longo caminho, que inclui estudar para as provas, começa com a escolha da especialização. Na maioria das universidades e hospitais, as especialidades médicas se dividem em três grandes áreas:

» As especialidades básicas e de acesso direto, como Clínica Médica e Medicina de Família;

» As clínicas, como Cardiologia e Endocrinologia, que exigem que o profissional tenha cursado uma especialidade básica previamente; e

» As cirúrgicas, como Cirurgia Plástica e Urologia, que também possuem pré-requisitos para o ingresso de novos residentes.

E as áreas de atuação, motivos de pulularem pelo Brasil cursos paralelos de especialização, como a Medicina Estética e Transplante Capilar, devem ter relação com a especialidade correspondente ‑ Dermatologia e a Cirurgia Plástica ‑ para assim se denominarem e divulgarem em seu carimbo, receituário ou cartão de visitas.

Sabe-se também que existe um contingente expressivo de médicos que atuam no mercado como especialistas, sem, no entanto, possuírem uma especialidade formal, obtida através do curso de uma residência médica reconhecida pelo MEC/Sociedade de Especialidades/CFM ou na realização de prova de títulos na Sociedade de Especialidade pretendida. Afinal, esse é o caminho.

É cada vez mais importante se comunicar bem com as pessoas. E na Medicina não é diferente. Para que as informações sejam passadas de maneira correta e ética, foi criada a Resolução CFM 1974/11. Essa importante norma trata das regras da publicidade médica e visa impedir o sensacionalismo, a autopromoção e a mercantilização do ato médico. Também evita abusos em propagandas e publicidades, que podem levar a processos ético-disciplinares. Isso é bom para a Medicina, para o paciente e para toda a sociedade.

Aqui entra a CODAME, Comissão de Divulgação de Assuntos Médicos do CRM. Tem em seu bojo normatizar, orientar e esclarecer sobre a ética publicidade médica no que concerne propagandas e divulgações médicas, evitando a autopromoção ou a exposição de seus pacientes e quem é que pode se intitular especialista.

Chegam à CODAME, diariamente, reclamatórias de que determinado profissional médico não detém titulação ou que clínica de atendimento médico não possua especialista registrado como tal ao fazer a sua divulgação ou apresentar a responsabilidade técnica. Esta comissão verifica toda a documentação que chega e a confere em seus arquivos, orientando quanto à correta divulgação de especialistas.

E a mais comum denúncia ou pedido de averiguações é mais que prosaica, por falta de atenção do médico ou da clínica aos regramentos do Código de Ética Médica: a ausência de seu RQE na sua propaganda pessoal (ou institucional). Há de se notar que a grande maioria é, sim, constituída de especialistas, mas que não registraram a titulação em seu Conselho de Classe. Outra inobservância de médicos refere-se à divulgação de múltiplos títulos. Como determina a legislação, ele pode divulgar no máximo duas especialidades reconhecidas, mesmo que detenha outras registradas e reconhecidas.

O Art. 117 do CEM diz ser “vedado ao médico deixar de incluir, em anúncios profissionais de qualquer ordem, seu nome, seu número no Conselho Regional de Medicina, com o estado da Federação no qual foi inscrito e Registro de Qualificação de Especialista (RQE), quando anunciar a especialidade.“

O parágrafo único reforça que nos anúncios de estabelecimentos de saúde devem constar o nome e o número de registro no Conselho Regional de Medicina do diretor técnico. E a própria Resolução CFM n º 1974/2011, que norteia a publicidade médica e dá os seus limites éticos, fixa em seu artigo 2º, que os anúncios médicos devem conter, obrigatoriamente, nome do profissional, especialidade e/ou área de atuação, quando registrada no CRM, e número de inscrição no Conselho, além do número de registro de qualificação de especialista (RQE), se o for, como aclarado na letra d.

O artigo 3º da mesma resolução decreta ser vedado ao médico, quando não especialista, anunciar que trata de sistemas orgânicos, órgãos ou doenças especificas por induzir a confusão com divulgação de especialidade.

Outro ponto da CODAME, em situação muito mais abrangente e problemática, é abordada no artigo 13 da mesma Resolução, que foi atualizada com a Resolução CFM nº 2.126/2015: “As mídias sociais dos médicos e dos estabelecimentos assistenciais em Medicina deverão obedecer à lei, às resoluções normativas e ao Manual da Comissão de Divulgação de Assuntos Médicos (CODAME)”.

Sempre que houver dúvidas, consulte o CODAME enviando email para codame@crmpr/.org.br ou para o Protocolo (protocolo@crmpr.org.br).

De qualquer modo, é relevante observar as seguintes recomendações:

1. Em seus anúncios de publicidade, utilize sempre o número do seu CRM e RQE, se o possuir.
2. Caso não tenha especialidade registrada, divulgar-se “médico” ou “médica”.
3. Para se obter uma especialidade médica, somente com residência médica reconhecida pela AMB/CFM e Sociedade de Especialidades ou fazendo a prova de títulos na Sociedade de Especialidade requerida.
4. Não deixar de, obrigatoriamente, registrar sua especialidade no CRM (pode ser feita por via eletrônica.
5. Verifique seu cadastro pessoal no site do CRM, pois pode ter seu número de RQE sem o saber.
6. Consulte a Resolução 1974/2011, o Manual de Publicidade, resumo de tudo que envolve o tema (aqui) ou ainda vídeo de aula da Educação Médica Continuada com dicas para se fazer publicidade (acesse aqui).      


Thadeu Brenny Filho é conselheiro do CRM-PR e membro da CODAME.

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