02/11/2007

SBCM contesta posicionamento do CONASEMS


A Sociedade Brasileira de Clínica Médica, filiada ao Conselho de Especialidades da Associação Médica Brasileira, e representante dos clínicos do Brasil, reunida com suas Regionais no último Congresso Brasileiro de Clínica Médica, lamenta profundamente a posição do Presidente do CONASEMS frente ao artigo "Reflexões sobre a Residência Médica", do Professor Antonio Carlos Lopes. A Associação Brasileira de Psiquiatria e outras especialidades médicas apóiam integralmente o referido artigo.



Reflexões sobre a Residência Médica

Criada por decreto presidencial em 1977 e regulamentada por lei em 1981, a Comissão Nacional de Residência Médica (CNRM) tem uma estrutura organizacional bem definida. Por intermédio de seu plenário, garante autonomia total nas discussões pertinentes a esse importante segmento da formação em medicina.

Os nove membros do plenário da CNRM são representantes de entidades de credibilidade e com inserção social, tendo seus assentos assegurados legalmente. Todos possuem vínculos, diretos ou indiretos, com a residência médica e trabalham com o objetivo de estabelecer resoluções para possibilitar a excelência no treinamento médico em nível de pós-graduação.

Esse mesmo plenário posiciona-se enfaticamente contra a violação dos direitos dos residentes e é opositor sistemático de qualquer tentativa de transformar os acadêmicos em mão-de-obra de ocasião.

Recentemente começou a ser divulgada mais intensamente uma versão de que a residência médica é uma política de saúde. Essa versão, é evidente, vêm daqueles que enxergam a medicina pela janela de seus gabinetes. São pessoas que hoje formam uma nova classe: a dos barachéis em medicina que estão longe da prática médica e que não interagem um momento sequer com a comunidade. Esse mesmo grupo, diga-se de passagem, quando necessita de atendimento, busca o médico que cursou a melhor residência, se possível, com mestrado, doutorado e pós no exterior.

As críticas à residência médica são, na maioria das vezes, desqualificadas, embora respeitadas de acordo com os princípios democráticos e o estado de direito, pois se trata da garantia do contraditório. Porém, os críticos têm de demonstrar coerência nas atividades profissionais. Afinal, não basta ter CRM para passar da categoria de bacharel para a de médico.

É primordial que a residência médica seja respeitada, que não seja vista sob a ótica estreita de política de saúde. Ela é muito mais: é e deve ser sempre encarada e tratada como política de governo, acima de partidos e de homens. É um instrumento essencial ao bom atendimento em saúde.

Aqueles que, por opção ou por incompetência, não conseguiram exercer a medicina, infelizmente passaram a se preocupar erroneamente com aquilo que é a pérola da coroa da assistência de qualidade: a residência médica. Talvez, futuramente, revejam seus valores distorcidos e comecem a contribuir para uma medicina melhor e uma saúde digna.

Prof. Antonio Carlos Lopes



Nota do CONASEMS

O Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde (CONASEMS), na pessoa de seu presidente, Helvécio Miranda Magalhães, vem se posicionar contra o artigo Reflexões sobre a Residência Médica, de autoria do atual Secretário-Executivo da Comissão Nacional de Residência Médica (CNRM), Dr. Antonio Carlos Lopes. O artigo mencionado apresenta opiniões retrógradas que não incorporam os grandes avanços que vêem ocorrendo nas áreas da saúde e da educação do país.

Tais opiniões não nos surpreendem pelo fato de terem sido emitidas pelo coordenador de uma Comissão que foi instituída no período da ditadura militar, mais voltada aos interesses das corporações que a compõem, centralizadora, e que ainda não incorporou todos os segmentos hoje envolvidos no processo de construção das políticas de saúde e educação médica do país.

Os atuais representantes da CNRM, por terem uma maior vinculação à medicina curativa e, particularmente, à área hospitalar, desconhecem as grandes necessidades do sistema de saúde, e, consequentemente, as necessidades integrais de saúde da população. Esta Comissão não acompanhou as mudanças ocorridas no país e necessita de ser modernizada, descentralizada e adequada às reais necessidades do sistema de saúde do país, no caminho que trilharam os melhores sistemas de saúde do mundo.

Os residentes são formados pelo setor público e, portanto, com recursos públicos, mas exercem as suas especialidades, preponderantemente, no setor privado, voltadas às necessidades de uma minoria da população. Além disso, as especialidades mais necessárias para o atendimento da maioria da população, que utiliza o Sistema Único de Saúde, não são priorizadas pela CNRM, agravando o quadro de desconexão entre o aparelho formador da graduação e o sistema de saúde do país.

A recente criação da Comissão Interministerial de Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde, que contou, na formulação do Decreto presidencial que a instituiu, com a participação de médicos, com residência e pós-graduação nas diversas áreas da medicina, inclusive, da saúde coletiva, possibilitará as mudanças, tão necessárias e almejadas na formação de médicos residentes. Essas mudanças apontam para o desenvolvimento de novas competências - técnicas e humanísticas -, que contribuam para a qualificação na formação dos residentes e para a integralidade da atenção à saúde da população.

É necessário sim que os residentes deixem de ser "mão de obra", o que, infelizmente, vem ocorrendo, inclusive por omissão da CNRM, e que se invista na melhoria da sua formação, nos aspectos qualitativos e quantitativos, para que atendam as reais necessidades de toda população brasileira.

Considerando o Artigo 200 da Constituição Federal, que determina ao SUS o ordenamento da formação dos recursos humanos na saúde, reiteramos nosso apoio à instituição da Comissão Interministerial de Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde, que desempenhará o importante papel de estabelecer as diretrizes para a formação dos profissionais de saúde no Brasil, inclusive da residência médica.

Helvécio Miranda Magalhães Júnior,
Presidente do CONASEMS



Manifestação da SBCM

A SBCM defende o direito ao contraditório, pois se trata de uma garantia da expressão democrática dos pensamentos e da divulgação de idéias, sejam corretas ou não. Faz essa colocação em virtude da infundada crítica do Dr. Helvécio Miranda Magalhães, presidente do CONASEMS, ao artigo "Reflexões sobre a Residência Médica". Em primeiro lugar, esclarece, para não deixar dúvida, que quando seu presidente defende uma política de governo, e sobretudo de estado, fala de uma política duradoura e responsável. A SBCM desqualifica o manifesto do presidente do CONASEMS, porém respeita por tratar-se de estado de direito.

O Prof. Antonio Carlos Lopes atua na vida acadêmica, na assistência e na pesquisa. Construiu uma carreira universitária da qual a SBCM se orgulha: é professor titular de uma das principais escolas médicas do país, a Universidade Federal de São Paulo - Escola Paulista de Medicina. Além disso, possui vínculo profundo com a comunidade do segmento de saúde que busca a excelência e a equidade no atendimento médico, sem exclusão social, e todos ao seu lado são testemunhos desta sua conduta.

No que diz respeito à residência médica, é absurdo achar que ela deva ser utilizada para solucionar diretamente os problemas da falta de médicos e especialistas no Brasil. A residência não é para isso. O médicos têm que ser formados de forma adequada para que possam ser realmente bons e possuir grande capacidade de resolução no momento em que entrarem de fato no mundo do trabalho, do atendimento aos pacientes.

A função do educador, e residência é educação em serviço, é criar condições para que o interessado aprenda a elaborar o próprio conhecimento, vivenciando a ética, as habilidades e as atitudes, e aprendendo pelo testemunho da presença de quem ensina. Evidentemente isso escapa ao alcance dos que apregoam a residência médica como fundamental para resolver problemas da distribuição de médicos no país, bem como das várias especialidades carentes em certas regiões, como se isso fosse culpa da CNRM.

Curioso é ver pessoas que se julgam a essência de democracia tentando desqualificar a Comissão Nacional de Residência Médica por ela ter sido casualmente criada nos tempos da ditadura militar. Muitas instituições, empresas e serviços públicos foram criados na mesma época. Nem por isso foram, se tornaram ou são ecos das vozes da exceção. Apesar da época em que foi criada, a CNRM representa a essência do atendimento médico bem qualificado.

Os julgamentos apressados e os ataques infundados são práticas que precisam mudar. Claro que o direito ao contraditório tem de ser garantido sempre. Porém, se as pessoas que teoricamente se consideram democratas começarem a praticar a democracia, certamente compreenderão que nem sempre são donas da verdade, que costumam errar, e até que errar é humano.

Infelizmente o Presidente do CONASEMS desconhece os paradigmas da CNRM, o compromisso por ela assumido em relação ao atendimento à comunidade menos favorecida. O que se deseja são médicos competentes, semelhantes àqueles que o Presidente do CONASEMS certamente busca para si e seus familiares.

A CNRM encontra-se, sim, atualizada e adequada às reais necessidades do sistema de saúde do país e espera apenas que o atendimento ambulatorial e dos hospitais da rede pública ofereça condições para um melhor treinamento dos residentes, uma vez que residência é aprendizado em serviço. Que consultas não sejam agendadas a longo prazo como são. Que os pacientes não permaneçam em macas ou em cadeiras e às vezes até deitados no chão por dias e dias. Porém, evidentemente, não é da alçada da residência médica resolver esta situação caótica.

A CNRM cumpre com seus objetivos, sensibilizada que é pelos problemas sociais de fato e não apenas por meio de discursos. Seus membros, representantes da várias entidades envolvidas com a residência médica, são competentes e extremamente sensíveis aos problemas da comunidade. Certamente a Comissão Interministerial, à qual o Presidente do CONASEMS se refere, será muito importante não apenas para subsidiar a CNRM, mas também para identificar as deficiências no sistema de saúde, e demonstrar que o problema não é da CNRM, mas sim da gestão da saúde no país, o que é de conhecimento de todos. Com a referida comissão ficará claro o porquê das dificuldades da Residência Médica e da CNRM para por em prática o que muito bem conhece. Se os residentes fazem greve, os hospitais públicos param o atendimento. Por quê? Que não se queira resolver o atendimento médico com a mão de obra barata do residente.

Mário da Costa Cardo Filho,
Diretor de Comunicação da SBCM



A Associação Brasileira de Psiquiatria também manifestou opinião sobre o assunto, clique aqui e leia o texto na íntegra.

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