13/01/2023

Plenária temática do CRM-PR debate cenário das escolas médicas e perspectivas na qualidade

Brasil já conta com 389 cursos e mais de 40 mil vagas de ingresso. Revogação de portaria do MEC restaura moratória prevista no Mais Médicos, mas existem 205 ações judiciais pleiteando novos cursos

O cenário atual dos cursos de Medicina foi tema em destaque em sessão plenária realizada pelo CRM-PR na última quinta-feira (12). O evento foi realizado presencialmente na Sede do Conselho em Curitiba e com participação pelo meio remoto de gestores públicos, coordenadores de escolas médicas, diretores de sociedades de especialidade e ainda conselheiros, membros das representações regionais do CRM e outras instituições médicas. O debate ocorre num momento em que o País já conta com 389 cursos médicos e vê com extrema preocupação pedidos de liminar que tramitam na Justiça visando a liberação de mais de duas centenas de outros, 18 deles no Paraná – sendo cinco em Curitiba.

A 90ª plenária temática foi aberta pelo presidente Roberto Issamu Yosida e contou com apresentação do conselheiro e professor José Knopfholz, atuante nas discussões nacionais sobre formação enquanto avaliador da Comissão de Acreditação de Escolas Médicas da Abem e CFM. No último dia 4, em meio à repercussão da revogação da Portaria 1.061/2022 do MEC, o tema já tinha merecido análise preliminar durante a 12ªreunião da Comissão de Ensino do CRM-PR, deliberando-se pela exposição junto à comunidade médica para fortalecer posição em prol da qualidade da formação, do estabelecimentos de critérios rígidos para abertura de novos cursos e vagas e de defesa de ações objetivas para fixação de profissionais nos – hoje – vazios assistenciais, como infraestrutura de serviços, carreira médica e acesso a recursos tecnológicos e de atualização de conhecimento.

Ao apresentar estatísticas da evolução histórica das escolas médicas e comparativos com o crescimento populacional, o conselheiro José Knopfholz chamou a atenção para o fenômeno que se projeta para o final desta década de se ter mais vagas do que candidatos, algo que já se mostra real em algumas regiões e sob o agravo da falta de docentes qualificados.

clique para ampliarclique para ampliarPlenária temática debateu cenário do ensino médico. (Foto: CRM-PR)

Como esclareceu o conselheiro José Knopfholz, durante aproximadamente meio século a população cresceu em percentual maior que o de médicos, o que começou a se inverter a partir dos anos 1970 até 2010. Na década seguinte, a população cresceu 4,8% e o número de médicos nada menos do que 24,7%, posicionando o Brasil com proporção de 2,4 profissionais para grupo de 1 mil habitantes, patamar muito próximo de algumas das maiores nações desenvolvidas do mundo. Em 20 anos, o número de escolas saltou de 100 para 337 até a chamada “moratória”. Contudo, desde 2019 foram abertos nada menos do que 52 cursos, alguns que aguardavam avaliação do Inep e muitos pela via judicial, o que encorpou o patamar de privados para 70% do total de 389.

A sessão plenária permitiu acolher informações de dificuldades vivenciadas pelas escolas médicas paranaenses, inclusive na reposição de integrantes efetivos do corpo docente e no equacionamento das disponibilidades de residências médicas, algumas ociosas. O presidente do CRM-PR, Roberto Yosida, ao agradecer os participantes do evento, ressaltou a importância do debate sobre a formação médica, que vai impactar na qualidade da assistência a ser oferecida à população. Acentuou que a classe médica precisa estar engajada em causas como esta e lembrou que, graças a mobilização empreendida no âmbito estadual desde a decretação da moratória, nenhuma nova escola foi aberta no Paraná.

CONFIRA ENTREVISTA DO PRESIDENTE DO CFM SOBRE O TEMA.

Entendendo a questão

O conteúdo da Portaria 1.061 foi definido ainda em meados de 2022, em consonância com o que foi debatido pelo Grupo de Trabalho (GAT) envolvendo todos os atores interessados no tema, incluindo Secretaria de Educação Superior do Ministério da Educação, Inep, CFM, AMB, Conselho Nacional de Educação, Abem, Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares, Associação Nacional das Universidades Particulares (Anup), Associação Brasileira de Mantenedoras de Ensino Superior (ABMES), Conselho de Reitores das Universidades Brasileiras (CRUB) e pesquisadores com expertise no assunto.

A portaria buscou redefinir o padrão decisório para autorização, reconhecimento e renovação de reconhecimento de cursos superiores de Medicina. Neste formato, a abertura de cursos se restringia ao chamamento público e de fortalecimento do SUS, em direção oposta ao modelo convencional, de via administrativa, sustentado em indicadores de avaliação de qualidade e alheio à observância dos requisitos sociais.

Como anunciado pelo novo ministro da Educação, a portaria foi revogada para que possa ser melhor avaliada. Na concepção do CFM, que também realizou reunião interna em 4 de janeiro, a norma definia conceitos fundamentais para a área, contemplando critérios para o bom desenvolvimento do processo de ensino e aprendizagem da Medicina. Dados do CFM reforçam que as 389 escolas médicas estão distribuídas em quase 250 municípios. Juntas, as instituições oferecem 41,8 mil vagas por ano. Do total de cursos, 42,9% (167) foram criados depois de 2013, sendo que 53,4% (208) estão no Sul e no Sudeste. Do total, 81,1% (315) estão em capitais e municípios de grande porte.

Atualmente, duas ações paralelas tramitam no Supremo Tribunal Federal sobre a abertura de cursos de Medicina ou de autorização para ampliação de vagas. Na iminência de uma decisão, o ministro Gilmar Mendes realizou, em 17 outubro de 2022, audiência pública para ampliar a análise do tema, o que vai refletir nas muitas ações com pedido de liminar que visam assegurar abertura de cursos e vagas sob aval da justiça. A Portaria do MEC, revogada, propunha “combater” esse caminho. Afinal, são 205 ações, 18 delas propondo novos cursos para o Paraná, cinco somente em Curitiba, onde já existe igual número de escolas em atividade e ofertam 759 vagas de ingresso. O total de escolas no Estado é de 21 (12 privadas, seis estaduais e três federais), com 2.279 vagas/ano.

Com a revogação da portaria, ficam restabelecidos os efeitos da “moratória” determinada pela Lei do Mais Médicos, que se estende até 5 de abril (reitere-se que 52 escolas foram abertas desde a tal moratória, em 2019; nenhuma no Paraná). De acordo com as estatísticas oficiais, o Brasil conta com proporção populacional e de médicos compatível com países do Primeiro Mundo. Os indicadores projetam 25% a mais de médicos a cada cinco anos, com o que os atuais – quase ‑ 550 mil profissionais passarão de 1 milhão já na década seguinte, posicionando o Brasil num dos países com maior patamar da relação médico/habitantes, mas, a considerar o cenário de hoje, com ínfimo investimento per capita em saúde e consequente infraestrutura precária.

A portaria revogada

De acordo com análise de entidades que participaram do GAT (grupo de trabalho), a Portaria 1.061 tinha em sua essência componentes para resolver a questão que está hoje para ser julgada no STF e, ainda, oferecer caminho de avanço no modelo de abertura de cursos médicos, em investimentos nos serviços públicos regionais e no planejamento de vagas em residências médicas mais necessárias, dentro do previsto Plano de Qualificação de Residências Médicas. Outro importante diferencial seria o Plano de Contrapartidas à rede local de saúde. Assim, a instituição mantenedora do curso deveria destinar ao menos 10% de sua receita bruta auferida a título de mensalidades e cobradas na forma da Lei 9.870/1999, alcançando infraestrutura de serviços, ações, programas e infraestrutura de saúde que tenham conexão com o funcionamento do curso e que constem do Plano de Inserção na Rede Local de Saúde. Além disto, o Plano de Oferta de Bolsas previa a destinação de bolsas de estudos integrais, no quantitativo de 10% do total das vagas ofertadas a cada ano, para estudantes que preenchessem os critérios fixados.

Como debatido pelos integrantes da Comissão, sem entrar no mérito dos dois modelos de abertura de escolas médicas, o principal aspecto está fincado na qualidade da formação, que vem sendo prejudicada exatamente pela ausência de instrumentos legais assertivos sobre o processo de inauguração de cursos e vagas, controle das diversas etapas até a conclusão e retaguarda com estrutura técnica, hospital-escola e corpo docente qualificado. Foi nesta seara que surgiu o Sistema de Acreditação de Escolas Médicas (SAEME-CFM), onde são reafirmados os compromissos com o exercício profissional ético e a formação de médicos competentes e adequados às necessidades do País. Em outra vertente, ressurge a preocupação com tentativas de suprir regiões desabastecidas de assistência com a figura física do médico, nem sempre com o preparo técnico, recursos e supervisão de que necessita. As entidades da classe médica são enfáticas ao combaterem o quantitativo em detrimento do qualificativo, que inclui as retaguardas secundárias e terciárias aos profissionais lançados à linha de frente dos serviços primários.

A Comissão

A Comissão de Ensino Médico do CRM-PR, criada pela Portaria 002/2022, é integrada pelo conselheiro-presidente Roberto Issamu Yosida e pelos conselheiros Maurício Marcondes Ribas, José Knopfholz, Carlos Roberto Naufel Junior e Alcindo Cerci Neto, todos professores de cursos de Medicina. Também acompanham os trabalhos o vice-presidente Wilmar Mendonça Guimarães e o secretário-geral Luiz Ernesto Pujol.

CONFIRA A ÍNTEGRA DA RESOLUÇÃO 1.061/2022, QUE FOI REVOGADA.

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